Um pouco de história

Em 1868 o bioquímico suíço Friedrich Miescher (1844-1895) descobriu compostos desconhecidos ricos em fósforo, carbono, hidrogénio, azoto e oxigénio, em núcleos isolados de células de pus, que designou por nucleína.

Em 1928, o médico inglês Frederick Griffith deparou-se com alguns resultados interessantes quando estudava uma bactéria patogénica, os pneumococos, Steptococcus pneumoniae. Esta bactéria causadora de pneumonia nos humanos é geralmente letal nos ratinhos. Algumas estirpes de S. pneumoniae produzem uma cápsula de polissacarídeos, produzindo colónias com aspeto liso (estirpe S, a designação S vem do inglês smooth, liso) quando cultivadas em laboratório em caixas de Petri; enquanto que as outras estirpes que não produzem cápsula formam colónias com aspeto rugoso (estirpe R, a designação R vem do inglês rough, rugoso).

Griffith verificou que as estirpes S eram virulentas, e quando inoculadas em ratinhos provocavam a sua morte, enquanto que as estirpes R não eram patogénicas. Numa outra etapa das suas experiências, Griffith sujeitou bactérias de estirpe S ao calor, provocando a sua morte, inoculou-as em ratinhos e verificou que os animais não morriam. Inoculou também uma mistura de bactérias estirpe S mortas por ação do calor e bactérias vivas de estirpe R e neste caso os ratinhos contraíram pneumonia e morreram (fig.1).

Figura 1. Esquema das experiências de Griffith.

Ao analisar o sangue dos ratos mortos conseguiu isolar bactérias vivas da estirpe S. Este facto sugeria que as bactérias da estirpe S conseguiam transmitir a sua virulência às bactérias vivas de estirpe R (não virulentas). Embora não conseguindo explicar este fenómeno, uma hipótese seria que de alguma forma a estirpe S teria a capacidade de transmitir a informação de virulência à estirpe R. Esta transmissão de informação por uma substância química ficou conhecida como princípio transformante.

O princípio transformante foi explicado com base nas experiências de Oswald Avery, Colin MacLeod e Maclyn McCarthy, em 1944. Avery e os seus colaboradores extraíram os vários compostos químicos das bactérias de estirpe S mortas pelo calor e testaram a sua capacidade transformante isoladamente em bactérias de estirpe R (fig.2). Estas experiências mostraram que os polissacarídeos, os lípidos, o RNA e as proteínas isoladamente não transformavam as estirpes R, apenas o DNA tinha essa capacidade. Embora a cápsula de polissacarídeos estivesse ligada à virulência das estirpes, era apenas a expressão fenotípica do DNA (ver fenótipo). O DNA era então o elemento transformante responsável pela transmissão da informação genética.

A comunidade científica não estava totalmente convencida da relevância do DNA dado que a estrutura da molécula de DNA com a de proteínas era menos complexa comparada com a das proteínas.

Figura 2. Esquema elucidativo das experiências de Avery, MacLeod e McCarthy.

As experiências de Alfred Hershey e Martha Chase, publicadas em 1952, permitiram esclarecer estas dúvidas. Hershey e Chase usaram um vírus que infeta as bactérias (bacteriófago) partindo do pressuposto de que a infeção pelo fago envolveria a introdução de informação viral dentro da bactéria. A estrutura molecular do vírus é relativamente simples, sendo maioritariamente de origem proteica com DNA dentro da cápsula proteica. Investigadores sabiam também que as proteínas não possuem fósforo (P) na sua constituição mas que este elemento químico integra a estrutura do DNA, e que o enxofre (S) está presente nas proteínas mas não no DNA.

Os fagos foram marcados com isótopos radioativos 32P e 35S, separadamente e usados para infetar E. coli. Após centrifugação numa batedeira de cozinha (esta experiência ficou conhecida não só pelos resultados mas pela utilização de material “caseiro” como a batedeira de uso doméstico, uma vez que o laboratório não tinha equipamento mais sofisticado), conseguiram separar as bactérias infetadas – que sedimentaram no fundo do recipiente – do sobrenadante com os restos virais (cápsulas dos fagos vazias). Quando mediram a radioatividade das duas frações notaram que o isótopo 35S não se encontrava presente nas bactérias ao contrário do isótopo 32P, isto é, tinha havido uma passagem do DNA do fago para o interior das células agora infetadas. O DNA viral dentro da célula passa a ser replicado juntamente com o DNA da célula de geração em geração. Estas experiências demonstram que o DNA é o material hereditário.

No início da década de 50 do século XX, vários trabalhos foram produzidos revelando mais informação sobre a composição e estrutura da molécula de DNA. Em 1950 Rosalind Franklin utilizando técnicas de difração de raios X, bombardeou amostras purificadas de DNA, o que permitiu concluir que a molécula deveria ter uma estrutura helicoidal (fig.3).

Figura 3. Imagem de DNA utilizando a técnica de difração de raios X (do original de Franklin 1950)

Na mesma altura, Erwin Chargaff e os seus colaboradores analisaram amostras de DNA de diferentes organismos, conseguindo isolar e quantificar as bases azotadas dessas amostras. Dessas experiências concluíram o que ficou conhecido como as Regras de Chargaff: - o DNA de espécies diferentes apresenta quantidades diferentes de cada uma das quatro bases azotadas; - a quantidade de timina é semelhante à de adenina e a de guanina semelhante à de citosina, sendo que a quantidade de bases púricas (guanina e adenina) é semelhante à das bases pirimídicas (citosina e timina). A=T e C=G, pelo que: (A+C)/(T+G)=1

Com base nos resultados de Chargaff e Franklin, em 1953, James Watson e Francis Crick, publicaram um artigo na Nature, propondo um modelo para a estrutura da molécula de DNA – a dupla hélice (ver foto):

  • duas cadeias polinucleotídicas enroladas em hélice;
  • ao longo de cada cadeia os nucleótidos estão ligados por ligações covalentes, do tipo fosfodiéster, estabelecidas entre o grupo fosfato de um nucleótido e a desoxirribose do nucleótido seguinte;
  • cada cadeia possui um grupo fosfato livre numa das extremidades, denominada extremidade 5’, e um grupo hidroxilo (OH) livre na outra extremidade, extremidade 3’. A extremidade 5’ de uma cadeia está emparelhada com a extremidade 3’ da outra cadeia, sendo as cadeia antiparalelas;
  • as duas cadeias estão unidas pelas bases pirimídicas e púricas. As cadeias estão unidas através de ligações por pontes de hidrogénio entre os pares de bases azotadas, uma purina com uma pirimidina. A adenina de uma cadeia liga-se à timina através de duas pontes de hidrogénio e a citosina liga-se à guanina da cadeia complementar através detrês pontes de hidrogénio – emparelhamento das bases complementares;

Por este trabalho, os dois investigadores foram galardoados com o Prémio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1962.

Resumo:

  • O DNA é um polímero constituído por monómeros denominados nucleótidos.
  • Os nucléotidos são constituídos por um açúcar – uma pentose – ligado a um carbono 5, a um ácido fosfórico e pelo carbono 1 a uma base azotada.
  • A pentose do DNA é uma desoxirribose (o que justifica o nome atribuído ao ácido: ácido desoxirribonucleico).
  • As bases azotadas são agrupadas em dois grupos: as bases púricas, de duplo anel, e as bases pirimídicas, de anel simples.
  • As purinas são a adenina e a guanina; as pirimidinas são a timina e a citosina.
  • O emparelhamento das bases complementares une a adenina com a timina e a guanina com a citosina.
  • As cadeias têm orientação oposta, são antiparalelas.

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