Em maio de 2017, no âmbito da ação de formação “Geologia, uma ciência alicerçada na Física e na Química”, fomos desafiadas a desenvolver atividades práticas que integrassem as referidas ciências. O documento “Aprendizagens essenciais” emanado pelo Ministério da Educação prevê que “os alunos se assumam como agentes ativos na construção do seu próprio conhecimento, pesquisando e organizando informação, analisando e interpretando dados, planificando e executando atividades práticas”, sendo que “as atividades práticas devem ser valorizadas e consideradas como parte integrante e fundamental dos processos de ensino e de aprendizagem em todas as temáticas”. Nesse sentido desenvolvemos e testámos três atividades experimentais, destinadas a alunos do 7.º ano, Ciências Naturais e/ou 11.º ano de Biologia e Geologia, para implementar em sala de aula. Com estas pretendemos simular processos análogos aos que ocorrem na Natureza, nomeadamente o desenvolvimento de cristais em cavidades cársicas, quer em ambiente aéreo sob a forma de estalactites e estalagmites, quer em solução aquosa (FIGURA 1). Optámos por escolher substâncias químicas que existem habitualmente nos laboratórios das escolas e que permitam analogias a substâncias associadas aos processos naturais de geodinâmica externa, em estudo.


FIGURA 1. Esquema simplificado das atividades desenvolvidas.

Formação das grutas calcárias, das estalactites e das estalagmites

Os calcários são fundamentalmente formados por um mineral chamado calcite, CaCO3 - carbonato de cálcio.

É a ação química das águas enriquecidas em dióxido de carbono que circulam nas zonas subterrâneas dos maciços calcários que, ao longo de milhões de anos, provoca a formação de galerias e cavidades que constituem as grutas – carbonatação (meteorização química) (FIGURA 2).


CaCO3 (calcite) + H2CO3 (ácido carbónico) ⇌ Ca2+ + 2HCO (ião hidrogenocarbonato ou bicarbonato)


Como resultado desta reação surge bicarbonato de cálcio dissolvido na água. Em determinadas circunstâncias, como mudanças de pressão e/ou de temperatura por exemplo, os iões precipitam originando as estalactites e as estalagmites.


FIGURA 2. Corte esquemático de algumas formações do modelado cársico (grutas).

  1. Quando chove, a água da chuva dissolve o dióxido de carbono existente na atmosfera e forma um ácido fraco (ácido carbónico). A acidez da água pode ser potenciada pelos ácidos húmicos resultantes da percolação da água na manta morta (secção superficial do solo em que as folhas, raízes e restante matéria orgânica existem em abundância em climas temperados).

  2. H2O + CO2 ⇋ H2CO3


  3. A lenta circulação das águas aciduladas, pelas fendas, leva à dissolução do calcário (calcite).

  4. H2CO3 + CaCO3 ⇌ Ca(HCO3)2


    Ao longo do tempo as fendas vão alargando e às vezes formam largos e longos canais subterrâneos onde há circulação da água (rios subterrâneos). As zonas mais alargadas correspondem às cavidades cársicas (cavernas, lapas, …) (C).

  5. As águas em circulação subterrânea contêm hidrogenocarbonato de cálcio Ca(HCO)2 em solução. Quando ficam saturadas, ocorre a precipitação de calcite podendo levar à formação das estalactites (A).

  6. Ca(HCO3)2 ⇋ CaCO3 + H2O + CO2


  7. A contínua circulação da água leva a que os pingos ao caírem no fundo da gruta, precipitem o carbonato de cálcio e se deposite a calcite, formando sucessivas camadas que dão origem às estalagmites (B).
  8. Quando as estalactites e as estalagmites se unem, formam uma coluna, processo que pode demorar de muitos milhares a milhões de anos.


Procedimento Experimental



As soluções 1, 2 e 3 foram preparadas com base em tabelas de solubilidade e garantiu-se a sua saturação: 1 - borato de sódio; 2 - sulfato de potássio e alumínio e 3 - bicarbonato de sódio.


*Como a experiência foi efetuada à temperatura ambiente e esta subiu muito, entre os dias 5 e 12, houve necessidade de adicionar mais solução 2.

Solução 1 - observámos a formação de cristais em meio aquoso, no cordão e na caixa de Petri;

Solução 2 - observámos a formação de cristais essencialmente em meio aquoso e alguns no cordão e na caixa de Petri;

Solução 3 - observámos a formação de cristais no cordão e na caixa de Petri.


Discussão dos resultados

As soluções correm por adsorção ao longo do cordão verificando-se, à medida que a água evapora, a formação de cristais, por precipitação, no cordão, no fundo do frasco e na caixa de Petri.

Nas soluções 1 e 3, o crescimento de cristais ao longo do cordão e na caixa de Petri, pode constituir um modelo análogo à formação dos cristais de calcite (estalactites, estalagmites, travertinos, tufos calcários) nas grutas dos maciços calcários ou em locais onde possam circular águas ricas em carbonato de cálcio. As soluções 1 e 3 são as melhores para demonstrar esse processo.

Nas soluções 1 e 2, os sais dissolvidos na água cristalizam à medida que a solução se torna sobressaturada pela evaporação da água. Este crescimento de cristais dentro da solução poderá ser análogo à formação de cristais de selenite, como os existentes na gruta de Naica, no México1.

Nota: deve-se utilizar cordão de algodão/fibras naturais. Com os cordões sintéticos corre- se o risco de não haver adsorção; devem-se utilizar corantes de cor clara o que permitirá observar mais facilmente o crescimento de cristais na solução.


Considerações finais

  • A formação e desenvolvimento de cristais, quer em laboratório quer na natureza, implicam determinadas condições do meio. Os principais fatores externos que condicionam a formação dos cristais são a agitação do meio, o espaço disponível e a temperatura. A variação da temperatura/humidade ambiente poderá alterar a velocidade com que ocorre o processo, tal como na Natureza.
  • Foi possível simular em laboratório, num curto intervalo de tempo (cerca de um mês) e de forma simples, a formação de cristais.
  • Procurou-se, através das atividades experimentais apresentadas, estabelecer a analogia com a formação de estalactites e estalagmites das paisagens cársicas e com o desenvolvimento de grandes e espetaculares cristais, em condições particulares.
  • Este tipo de atividade permite implementar um Domínio de Autonomia Curricular (DAC), opção curricular de trabalho interdisciplinar e articulação curricular, pois possibilita fazer a interseção de aprendizagens essenciais das disciplinas de ciências naturais, física e química e outras. Proporciona aos alunos a oportunidade de utilizar o método científico para pesquisar o mundo natural. Com base nas aprendizagens essenciais das disciplinas, será possível explorar diferentes percursos pedagógico-didáticos, em que se irá privilegiar o trabalho prático, o uso de ferramentas colaborativas online, o desenvolvimento das capacidades de pesquisa e análise, de forma a tornar as aprendizagens mais significativas. Podem ser explorados os conceitos de fórmula química de um sal ou os conceitos de reação química, solução saturada, evaporação e precipitação, meteorização química das rochas, carbonatação, etc..
  • Consideramos muito importante que desde cedo os alunos aprendam a relacionar as várias Ciências de forma holística e que interiorizem que, para estudar processos da natureza, precisam de recorrer a várias áreas do conhecimento científico.