Fusão nuclear
📧
- Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Referência Ribeiro, D., (2014) Fusão nuclear, Rev. Ciência Elem., V2(4):083
DOI http://doi.org/10.24927/rce2014.083
Palavras-chave fusão; nuclear;
Resumo
A fusão nuclear consiste na reação entre dois núcleos atómicos leves que resulta na produção de uma espécie nuclear mais pesada do que os núcleos atómicos iniciais.1 Aquando da compressão de dois núcleos de hidrogénio, por exemplo, eles podem fundir-se formando um núcleo de hélio, libertando uma gigantesca quantidade de energia ao longo do processo. Com sucessivas reações de fusão nuclear, todos os elementos químicos conhecidos podem ser sintetizados a partir do hidrogénio.
O legado dos fenómenos de fusão nuclear remonta a 1920 quando o astrónomo Sir Arthur Eddington (1882 – 1944) propõe a ocorrência de fusões nucleares nos seus modelos estelares. Contudo, apenas nos anos 30 é que a fusão nuclear é verificada experimentalmente.2 Em 1932 a fusão de isótopos de hidrogénio é conseguida em laboratório e em 1939 o físico nuclear Hans Bethe (1906 – 2005) descreve os processos de fusão nuclear existentes nas estrelas (nucleossíntese estelar).
A fusão nuclear é um fenómeno incrivelmente difícil de ser provocado, exigindo temperaturas da ordem de muitos milhares de graus Celsius. No entanto, quando alcançado, liberta muito mais energia do que a que consome. A energia gigantesca necessária para ativar o processo de fusão nuclear deve-se, essencialmente, à barreira de forças electroestáticas entre os núcleos (carregados positivamente).
Uma das mais importantes cadeias de reações de fusão nuclear ocorre no Sol e estrelas idênticas que utilizam como “combustível” o seu hidrogénio produzindo hélio (ver figura 1). As equações que descrevem o processo exposto na figura 1 podem também ser escritas3
\[{}_1^1 H + {}_1^1 H \longrightarrow {}_1^2 H + e^+ + \nu + 0,42 MeV\]
\[{}_1^1 H + {}_1^2 H \longrightarrow {}_2^3 He + \gamma + 5,49 MeV\]
\[{}_2^3 He + {}_2^3 He \longrightarrow {}_2^4 He + _1^1 H + {}_1^1 H + 12,86 MeV\]
em que \({}_1^1 H\) é um protão, \({}_1^2 H\) é o deutério, \(e^+\) é um positrão (ou eletrão positivo), \(\nu\) é um neutrino (que não possui nem número atómico nem número de massa), \({}_2^3 He\) é o hélio-3, \(\gamma\) é um fotão gama e \({}_2^4 He\) é o isótopo mais estável do hélio (também denominado de partícula alfa).
Note-se que a libertação de energia neste processo está expressa em MeV/átomo em vez de kJ/mol, o que evidencia a enorme diferença entre as ordens de grandeza das energias envolvidas nas reações químicas e nas nucleares. Por exemplo, a combustão do gás propano debita 2220 J por cada mole de gás (3,60 x 10-21 J/molécula de propano) que reage enquanto a anterior reação de fusão nuclear entre dois núcleos de hélio-3 com a formação de um núcleo de hélio-4 e dois protões debita 110 x 1012 J por cada mole de átomos de hélio-4 formado (18 x 10-11 J/átomo = 12,86 MeV/átomo).‡
A escrita de equações que traduzem reações de fusão nucleares (tal como as de fissão nuclear) obedece a duas regras específicas5:
- Regra Z – A soma dos números atómicos, Z, das partículas reagentes é igual à soma dos números atómicos dos produtos de reação;
- Regra A – A soma dos números de massa, A, das partículas reagentes é igual à soma dos números de massa dos produtos da reação.
A mais importante e desejada aplicação da fusão nuclear reside na construção de reatores termonucleares de fusão. Todavia, apesar do gigantesco esforço mundial, a fusão nuclear controlada ainda não foi atingida. Embora algumas reações nucleares de fusão já tenham sido realizadas em condições laboratoriais, tais como3
\[{}_1^2 H + {}_1^3 H \longrightarrow {}_2^4 He + n + 17,6 MeV\]
\[{}_1^2 H + {}_1^2 H \longrightarrow {}_2^3 He + n + 3,2 MeV\]
\[{}_1^2 H + {}_1^2 H \longrightarrow {}_1^3 H + _1^1 H + 4,0 MeV\]
A principal dificuldade na obtenção de energia a partir da fusão nuclear reside no problema da contenção do material combustível a temperaturas bastante elevadas (suficientemente elevadas para ser possível suplantar a barreira electroestática) durante um intervalo de tempo considerável.3 Uma equipa internacional de cientistas está a colaborar na construção de um reator de fusão chamado International Thermonuclear Experimental Reator (ITER), que irá testar a viabilidade comercial da utilização da fusão nuclear.2 Contudo, ainda há muito trabalho a ser realizado antes da energia proveniente da fusão nuclear poder ser comercializada.
‡ Como 1 eV = 1,6022 x 10-19 J, 1 MeV/átomo corresponde a 9,65 x 107 kJ/mol.6
Referências
- 1 IUPAC Gold Book: Nuclear fusion reaction, consultado em 08/12/2011;
- 2 J. Baker, 50 Ideias Que Precisa Mesmo De Saber – Física, 1ª edição, Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2011, ISBN: 978-972-20-4707-4
- 3 A. Das, T. Ferbel, Introduction to Nuclear and Particle Physics, 2nd edition, New Jersey: World Scientific, 2003, ISBN: 981-238-744-7;
- 4 Wikimedia Commons: Fusion in the Sun, consultado em 08/12/2011;
- 5 C. Corrêa, F. P. Basto, N. Almeida, Química, 1ª edição, Porto: Porto Editora, 2008, ISBN: 978-972-0-42248-4;
- 6 NIST electron volt-joule relationship, consultado em 08/12/2011.
Este artigo já foi visualizado 9979 vezes.