Digestão Extracelular
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- Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa
Referência Moreira, C., (2014) Digestão Extracelular, Rev. Ciência Elem., V2(4):252
DOI http://doi.org/10.24927/rce2014.252
Palavras-chave Digestão; Extracelular; molécula; organismo; animais; órgãos;
Resumo
Digestão é o conjunto de processos através do qual moléculas complexas alimentares são transformadas em moléculas mais simples, que podem ser absorvidas. A digestão extracelular pode ser extracorporal, como nos fungos, que ocorre fora do organismo ou intracorporal, como acontece nos animais, dentro do organismo. A digestão extracelular intracorporal ocorre, em animais, fora das células em cavidades digestivas – na cavidade gastrovascular ou no tubo digestivo, onde são lançados sucos digestivos que contêm enzimas, que atuam sobre as partículas alimentares transformando-as em partículas mais simples. A evolução dos sistemas digestivos foi no sentido do aumentar da complexidade do sistema digestivo e com órgãos anexos, o que permite um maior consumo e maior aproveitamento dos alimentos.
Nos animais o tubo digestivo pode apresentar diferentes graus de complexidade, e pode ser agrupados em dois grandes grupos: tubo digestivo incompleto e completo.
- tubo digestivo incompleto: possui apenas uma abertura, que funciona como boca e ânus, mas a cavidade digestiva apresenta alguma diferenciação.
- tubo digestivo completo: possui duas aberturas independentes, a boca e o ânus.
Tubo digestivo incompleto Os sistemas digestivos quer dos Cnidaria quer dos Plathelminte apresentam apenas uma abertura, que estabelece a comunicação entre o exterior e a cavidade grastrovascular. No caso da Hidra (Cnidaria), as partículas alimentares são capturadas com o auxílio de tentáculos que rodeiam a boca e que possuem células urticantes – cnidócitos – que libertam substâncias que imobilizam as presas. A digestão tem início na cavidade gastrovascular revestida por uma camada interna – gastroderme – que possui dois tipos de células: as glandulares, que produzem enzimas digestivas que são lançadas para a cavidade gastrovascular (digestão extracelular) e as digestivas, que captam as partículas semidigeridas por fagocitose originando vacúolos digestivos, nos quais continua a digestão (digestão intracelular). As partículas não absorvidas e as que são libertadas por exocitose (do interior das células para a cavidade gastrovascular) são expulsas da cavidade gastrovascular pela abertura (que serve de boca e ânus).
Na planaria (Plathelminte) embora também só com uma abertura o tubo digestivo já possui alguma diferenciação, com uma faringe musculosa e retráctil. A cavidade gastrovascular é muito ramificada, aumentando a área de digestão e de absorção, e a gastroderme apresenta células com diferentes funções: secretoras de enzimas, fagocitárias e ciliadas. Como na hidra a digestão é extra e intracelular.
Tubo digestivo completo O sistema digestivo completo que muitos animais apresentam confere grandes vantagens aos organismos que o possuem:
- os alimentos deslocam-se num só sentido, permitindo uma digestão e absorção sequenciais ao longo do tubo digestivo;
- a digestão pode ocorrer em diferentes órgãos especializados do tubo digestivo, por processos mecânicos e enzimáticos distintos;
- a absorção torna-se mais eficiente por ocorrer em diferentes áreas
- os resíduos não digeridos podem ser mais facilmente eliminados pelo ânus e não se misturam com os alimentos ingeridos.
A minhoca (Annelida) possui um tubo digestivo completo com regiões bem diferenciadas (ver fig).
A matéria em decomposição de que se alimenta a minhoca entra pela boca para a faringe, passa para o esófago até ao papo, onde é armazenada e humidificada. Na moela, as partículas são trituradas com o auxílio de grãos de areia que também são ingeridos juntamente com os alimentos. Quando chegam ao intestino as partículas alimentares são sujeitas à ação enzimática das hidrolases, e são, posteriormente, absorvidos os nutrientes resultantes. A superfície de absorção do intestino é aumentada pela existência de uma prega dorsal da parede interna – tiflosole. Os resíduos não absorvidos são eliminados através do ânus.
Os vertebrados, embora partilhem uma constituição básica, apresentam variações morfológicas relacionadas com o regime alimentar. Todos os vertebrados possuem dois órgãos anexos – o fígado e o pâncreas, que produzem secreções que são lançadas para o intestino. Alguns animais têm glândulas salivares, que produzem enzimas que iniciam a digestão química de alguns substratos.
Os vertebrados também possuem dentes, com exceção das aves, para a mastigação dos alimentos ingeridos, facilitando os processos mecânicos de digestão.
As aves possuem boca com diferentes tipos de bicos. Quase todas as aves possuem ao nível do esófago, uma dilatação – o papo, onde os alimentos são armazenados e amolecidos. O estômago das aves tem dois compartimentos: o proventrículo onde é segregado suco gástrico rico em enzimas e a moela, com uma parede espessa e musculosa para uma eficiente digestão mecânica para triturar os alimentos. Algumas aves carnívoras não têm papo e o estômago é formado por um único compartimento de parede fina e elástica. Depois da moela as partículas digeridas seguem para o intestino onde é concluído o processo de digestão e é feita a absorção. A parte final do reto abre-se para o exterior através do cloaca.
Nos mamíferos, em geral, o tubo digestivo alcança um elevado grau de especialização. Na cavidade bucal existe uma dentição diferenciada conforme o tipo de alimentação. À boca segue-se a faringe, o esófago e o estômago. O estômago dos carnívoros e omnívoros tem apenas um compartimento em forma de saco com paredes musculosas e revestido internamente por um epitélio rico em glândulas secretoras de suco gástrico – mistura de ácido clorídrico e de enzimas. Também no estômago é libertada mucina, uma substância que protege o próprio órgão da acidez do suco gástrico. O estômago comunica com o intestino, que é muito mais extenso nos herbívoros para aumentar a eficiência de absorção dado que os vegetais são de mais difícil digestão. Uma das adaptações dos herbívoros é a existência de bactérias específicas na região cecal do intestino capazes de degradar a celulose.
No caso do Homem, a digestão inicia-se na boca com movimentos mecânicos da mastigação e pela ação enzimática da amilase da saliva, produzindo-se o bolo alimentar que passa pelo esófago até ao estômago. É no estômago e, sobretudo, no intestino delgado que ocorre a maioria do processo digestivo. O estômago possui uma parede musculosa rica em glândulas produtoras de ácido clorídrico e enzimas proteolíticas ( que em conjunto com os movimentos peristálticos (movimento das paredes do estômago) continuam a digestão do bolo alimentar originando o quimo que passa para o duodeno (parte inicial do intestino delgado). As paredes do duodeno contêm glândulas que produzem suco intestinal rico em enzimas como a maltase, sacarase, peptidase e lactases, que atuam sobre o quimo, em simultâneo com a bilís (atua no metabolismo lipídico), produzida pelo fígado, e o suco pancreático (rico em lipases, proteases, amilases e nucleases), produzido pelo pâncreas. Resulta dessa atividade o quilo. As moléculas simples resultantes destes processos digestivos são absorvidas através da parede intestinal, muito vascularizada e com pregas cobertas de vilosidades, que aumentam grandemente a superfície de absorção. As células epiteliais das vilosidades por sua vez possuem microvilosidades que aumentam ainda mais a superfície de absorção. Por difusão ou por transporte ativo, os nutrientes atravessam o epitélio intestinal, e são absorvidos diferencialmente para a corrente sanguínea (aminoácidos, água, glicose, sais minerais e vitaminas hidrossolúveis) e para a corrente linfática (ácidos gordos, glicerol e vitaminas lipossolúveis). Os resíduos alimentares não absorvidos passam para o intestino grosso, para serem eliminados via ânus. No intestino grosso também se dá a reabsorção de parte da água libertada para o tubo digestivo.
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