Educação científica e desenvolvimento económico
📧
- Departamento de Química e Bioquímica, Faculdade de Ciências, Universidade do Porto
Referência Gomes, J.A.N.F., (2017) Educação científica e desenvolvimento económico, Rev. Ciência Elem., V5(2):015
DOI http://doi.org/10.24927/rce2017.015
Palavras-chave desenvolvimento; economia; educação; emprego;
Resumo
O programa de austeridade decorrente do pedido de ajuda financeira à Troika levou o desemprego a subir até ao máximo de 16,2% em 2013 para voltar aos 11,1% em 2016. Simultaneamente, o desemprego jovem (menores de 25 anos) subiu até 38,1% e estava ainda em 28% em 2016. A educação continua a proteger do desemprego (e a garantir maior salário e melhor saúde), mas o efeito parece atenuado.
Taxa de desemprego: total e por nível de escolaridade completo (%) | |||||
Anos | Total | Nível de escolaridade | |||
Nenhum | Básico | Secundário e pós secundário |
Superior | ||
2011 | 12,7 | 11,6 | 13,7 | 13,4 | 9,0 |
2012 | 15,5 | 14,4 | 16,1 | 17,6 | 11,6 |
2013 | 16,2 | 17,3 | 17,0 | 17,4 | 12,6 |
2014 | 13,9 | 13,9 | 15,0 | 15,3 | 10,0 |
2015 | 12,4 | 13,2 | 13,2 | 13,9 | 9,2 |
2016 | 11,1 | 13,1 | 11,8 | 12,2 | 8,4 |
Estes resultados merecem alguma reflexão. Em primeiro lugar, o choque de haver algum desemprego de graduados. Depois, o facto de o diploma do secundário (ou do pós-secundário, CET, Curso de Especialização Tecnológica) já não oferecer a desejada garantia. Independentemente da leitura que queiramos fazer e da dificuldade resultante da falta de dados mais desagregados por tipo de educação-formação, um facto é ineludível: Temos um desajuste entre a oferta e a procura de competências.
Portugal atrasou-se imenso na criação de um ensino secundário profissionalizante e ainda hoje há deficiências notórias. A participação é baixa e a qualidade talvez se ressinta de não haver padrões nacionais de avaliação e comparação. A criação do ensino pós-secundário (CET) foi muito lenta e criou alguma ambiguidade quanto ao objetivo final de entrada no mercado de trabalho ou de passagem a licenciatura. Finalmente, só em 2014 foi criado o ciclo curto de ensino superior, TeSP, Técnico Superior Profissional, que está a crescer a muito bom ritmo, mas se ressente de um grande atraso histórico. (Note-se que em Espanha, 35% dos primeiros diplomas de ensino superior são de ciclo curto, contra 40% de licenciatura e 25% de mestrado, segundo o Education at a Glance, 2016.)
Todos os peritos apontam a necessidade de o sistema educativo se aproximar da realidade da vida profissional a todos os níveis. Com o ensino obrigatório até aos 18 anos, isto significa uma nova atenção ao perfil de formação profissionalizante da metade dos jovens que não aspira a entrar imediatamente no ensino superior. Este é um enorme desafio para o nosso sistema de ensino básico e secundário que há pouco mais de 10 anos se focava quase exclusivamente num ensino de cariz académico dirigido para o acesso ao ensino superior.
Mas, o desafio no ensino superior não é menor. Os diplomados deixaram já de estar destinados à administração pública e a alguns corpos profissionais autónomos (médicos, engenheiros, etc). Com a massificação do acesso que já se aproxima dos 50% da coorte, as instituições de ensino superior têm de assumir que o futuro dos jovens que recebem nos seus auditórios e laboratórios será, maioritariamente, no setor privado exercendo todo o tipo de atividade. E nem sempre farão uso direto do perfil de formação que seguiram na universidade ou no instituto politécnico. Esta realidade é inelutável e exige da parte das instituições um repensar dos planos de estudos e da experiência educativa proporcionada aos jovens.
Os setores da nossa economia em crescimento mais rápido são o turismo e os serviços informáticos, mas todos reconhecemos que não podemos deixar de insistir em estratégias de crescimento de produção e exportação de bens (ou, numa linguagem mais moderna, de um misto de serviço-produto). A identificação destas áreas mais dinâmicas implica uma resposta atempada do sistema educativo onde a educação científica tem um papel muito importante.
Uma sociedade democrática próspera exige que toda a população esteja preparada para ter um papel ativo na economia e na sociedade; deve ainda ter a capacidade de compreender as grandes opções e assumir as decisões que melhor acautelem o seu futuro no médio e longo prazo. Só uma educação com uma forte componente científica permite atingir estes objetivos. A Casa das Ciências propõe-se reforçar esta cultura que leve a uma melhor compreensão do ambiente que nos rodeia e a uma capacidade de tomar decisões mais informadas.
Este artigo já foi visualizado 4105 vezes.