Malthus não tentou traduzir matematicamente o seu modelo de crescimento. Limitou-se a caraterizá-lo pressupondo que a taxa segundo a qual a população cresce num determinado instante é proporcional à população total nesse mesmo instante.

Numa revisão da primeira edição discutiu em detalhe os obstáculos para o crescimento da população em vários países, nomeadamente atraso no casamento, aborto, infanticídio, fome, guerra, epidemias e fatores económicos. Para ele, o casamento retardado era a melhor opção para estabilizar a população.

Para caraterizar matematicamente este modelo, considerando o crescimento em anos consecutivos e supondo uma taxa de crescimento r em cada ano, se num ano n a população é Pn no ano seguinte a população será Pn+1=(1+r)Pn, pelo que Pn+1=(1+r)nP0 e o crescimento é descrito por uma progressão geométrica de razão 1+r.


FIGURA 1. Thomas Malthus.

Supondo uma variação contínua do tempo, e designando por P(t) a população no instante t e por r a taxa de crescimento por unidade de tempo, a equação diferencial que traduz o modelo contínuo preconizado por Malthus é P(t)=rP(t). Então, P(t)=kert com k constante.

Como P(0)=k, e P0 o número de indivíduos no ano zero, a evolução da população é dada por P(t)=P0ert.

Acontece que 50 anos antes, em Introductio in analysin infinitorum, no VI capítulo “De quantidades exponenciais e logaritmos” para ilustrar a grande utilidade das tabelas de logaritmos para abreviar cálculos numéricos, o matemático suíço Leonhard Euler (1707-1783) dá vários exemplos que envolvem o crescimento populacional, de que transcrevemos os exemplos II e III.


FIGURA 2. Leonhard Euler e o seu Introductio in analysin infinitorum.


Exemplo II

“Se a população em certa região aumenta anualmente um trigésimo e, por outro lado, lá habitavam no princípio 100000 pessoas, pergunta-se qual o número de habitantes após 100 anos.

Seja o número inicial = n, pelo que n = 100000; passado um ano o número de habitantes será =(1+130)n=3130n: depois de dois anos = (3130)2n; ao cabo de três, (3130)3n, e daqui depois de 100 anos será =(3130)100n=(3130)100100000: cujo logaritmo é =100l3130+l100000. E l3130=l31l10=0,014240439 de onde, 100l3130=1,4240439, que somando-lhe l100000=5 será o logaritmo do número de habitantes procurado, =6,4240439, a que corresponde o número 2654874.

Assim ao cabo de 100 anos será mais de vinte e seis vezes maior.”


Este exemplo publicado em 1748 é, meio século antes, a concretização do “Modelo Malthusiano” para uma população de 100000 habitantes e uma taxa de crescimento anual de 1/30.

No exemplo seguinte Euler faz alusão ao capítulo 7 do Livro do Genesis que relata como um dilúvio reduziu a população da terra a seis seres humanos.


Exemplo III

“Como a humanidade se espalhou após o dilúvio por obra de seis seres humanos, se o número destes alcançar duzentos anos depois o número 1000000, pergunta-se em que parte deveria crescer anualmente o número de humanos.

Se aumentar em cada ano 1x, duzentos anos depois o número de humanos seria =(1+xx)2006=1000000 e por tanto 1+xx=(10000006)1200.

Portanto l1+xx=1200l10000006=1200.5,2218487=0,0261092


e assim 1+xx=10619631000000 e 1000000 = 61963x donde x =16 aproxidamente.

Bastará pois que os humanos aumentem por ano a sua décima sexta parte [...]. Contudo, se o número de homens tivesse crescido na mesma proporção durante um intervalo de 400 anos, deveria chegar a 1000000. 10000006=166666666666, cujo sustento a terra inteira não seria de forma alguma capaz de dar.”


Euler, ao abordar o crescimento das populações, tinha uma preocupação matemática – a de mostrar a utilidade dos logaritmos – que ilustrou com exemplos.

Mas a observação anterior leva a crer que ele considerou o modelo exponencial desadequado para o estudo do crescimento populacional.

A população de Portugal espelha bem a falência deste modelo. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, nos duzentos anos que decorreram entre 1770 e 1970, a população nem chegou a triplicar.



TABELA 1. População de Portugal entre 1422 a 1890.



Quanto a Malthus, as suas preocupações eram de natureza política e legislativa. Tomou como certo um crescimento exponencial da população mundial que conduziria a uma catástrofe por ausência de recursos e, para o travar, sugeriu o recurso a políticas adequadas. Ao publicitar o modelo exponencial - que ficou conhecido como Modelo Malthusiano - ligando-o a problemas legislativos reais, abriu caminho para que diferentes matemáticos se dedicassem à modelação do crescimento populacional.

Em 1844, o matemático belga Pierre Verhulst (1804-1849) propôs no artigo Recherches mathématiques sur la loi d’accroissement de la population, um modelo em que considera que, à medida que a população se aproxima de um valor máximo, a taxa de crescimento diminui: “O aumento virtual da população é, portanto, limitado pelo tamanho e pela fertilidade do país. Como resultado, a população fica cada vez mais próxima de um estado estável”.

Designado por P(t) a população no instante t, por r a taxa de crescimento por unidade de tempo e por M o número máximo de indivíduos que a região pode suportar, este modelo exprime-se pela equação diferencial


dPdt=rP(1P(t)M),


cuja solução é


P(t)=P(0)ert1+P(0)(ert1)M,


Se P(t) for muito pequeno face a M tem-se que dPdtrP(t) que tem a solução P(t)P(0)ert, e o crescimento é exponencial.


FIGURA 4. Pierre François Verhulst e o gráfico da curva logística.


À medida que t cresce a população aproxima-se assintoticamente de M. A equação diferencial que carateriza este modelo é atualmente designada por equação logística e a população máxima M por capacidade de carga. Com Verhulst relativizou-se “a hipótese da progressão geométrica, uma vez que ela só se pode verificar em circunstâncias muito especiais; por exemplo, quando um território fértil de tamanho quase ilimitado passa a ser habitado por pessoas com uma civilização avançada, como foi o caso das primeiras colónias americanas”.

Essa equação foi retomada por vários matemáticos e adaptada a contextos variados. São de realçar os casos em que a capacidade de carga varia como o tempo conduzindo ao modelo caraterizado pela equação diferencial


dPdt=rP(1PM(t))


onde a capacidade de carga M(t) = M(t +T) varia periodicamente com período T.


FIGURA 5. A demografia é instrumental para o controlo das populações humanas.


Desde o século XVIII que o estudo da dinâmica das populações é objeto de modelação matemática. Na atualidade existem outros modelos de crescimento: hiperbólicos, exponenciais, logísticos ou baseados noutras funções. Baseada nos modelos populacionais do matemático Song Jian, a República Popular da China em 1980, então a atingir o bilião de habitantes, instaurou uma política estrita de filho único. Essa lei foi flexibilizada em 2015, aumentando para dois o número máximo de filhos, para fazer frente ao envelhecimento da população e à redução do grupo de trabalhadores na faixa etária considerada economicamente ativa.

Muitos dos pareceres científicos nas mais diversas áreas baseiam-se em modelos matemáticos que podem permitir fazer estimativas e previsões, mas … ao olhar para o crescimento populacional ao longo dos tempos verificamos que os modelos matemáticos são instrumentais na análise da dinâmica das populações.