Quem não fica deslumbrado com a explosão de cores e formas que ilumina o céu durante um espetáculo de fogo de artifício? O fogo de artifício não é mais do que uma dança sincronizada de elementos químicos que recriam no céu as cores do arco-íris.

O componente fundamental do fogo de artifício é a “concha”, normalmente um tubo de papel cheio com pólvora negra e pequenos globos de material explosivo chamados “estrelas” (FIGURA 1).


FIGURA 1. Esquema de uma “concha” pirotécnica.

Cada “estrela” contém quatro ingredientes químicos: um material combustível, um agente oxidante, um composto metálico responsável pela cor e um aglutinante para manter estes componentes unidos.

Toda a luz, cor e som resultam destes compostos químicos. Durante a explosão, o agente oxidante e o combustível reagem de forma violenta, libertando calor intenso e materiais em fase gasosa. É a expansão brusca destes materiais gasosos que cria a onda de choque que nos chega aos ouvidos como o som da explosão. E é o calor libertado nesta reação o responsável pelo brilho e cor do fogo de artifício.

As cores do fogo de artifício são obtidas essencialmente por um processo designado por “luminescência”: a energia libertada na explosão é absorvida pelos átomos dos metais presentes na composição da “estrela”, promovendo os seus eletrões do estado fundamental para níveis excitados. O regresso dos eletrões ao estado fundamental ocorre com libertação da energia sob a forma de radiação visível, ou seja, luz colorida. A cor da luz emitida varia consoante o metal utilizado: o vermelho é normalmente obtido com sais de estrôncio ou de lítio, o cor de laranja é característico de sais de cálcio, como o cloreto de cálcio, o amarelo é facilmente obtido com sais de sódio, sendo vulgarmente utilizado o cloreto de sódio, o verde é obtido com cloreto de bário, enquanto o azul é obtido com cloreto de cobre (FIGURA 2).


FIGURA 2. Elementos químicos comummente utilizados em pirotecnia para a obtenção de cor.

As propriedades destes sais tornam a pirotecnia uma ciência química exigente: é preciso garantir a estabilidade de alguns destes compostos, controlar rigorosamente a temperatura de explosão e impedir a contaminação que mistura as cores. Em particular, é imperioso evitar a contaminação com sódio: o brilho intenso da emissão do sódio facilmente “amarela” todo o fogo de artifício.


Um pouco de história

O fogo de artifício teve a sua origem quando a química ainda não existia como ciência. Há registos da utilização de misturas incendiárias em celebrações religiosas na Ásia por volta de 2000 a.C.. No entanto, a pólvora – principal componente do fogo de artifício – foi descoberta na China apenas no século IX, quando um alquimista chinês juntou, acidentalmente, salitre, enxofre e carvão e aqueceu a mistura (a pólvora tem uma composição típica de 75% de nitrato de potássio, 15% de carvão e 10% de enxofre). Os primeiros mestres pirotécnicos eram, na verdade, alquimistas que mantinham em segredo as suas receitas geradoras de fogos coloridos.

O fogo de artifício, na sua forma colorida e brilhante como conhecemos hoje, surgiu com o nascimento da Química e o seu desenvolvimento está relacionado com grandes nomes desta ciência. Antoine Laurent Lavoisier, considerado pai da Química, foi responsável por revolucionar a produção da pólvora, durante a Revolução Francesa. Os seus estudos sobre as combustões acenderam o rastilho para que outros químicos procurassem elementos ricos em oxigénio, produzindo assim explosões mais violentas e temperaturas mais elevadas. Em finais do século XVIII, Claude Louis Berthollet, descobre o clorato de potássio, que ainda hoje é utilizado nos foguetes. Com o desenvolvimento da química e do conhecimento da matéria, foi aumentando a segurança, o brilho e o número de cores disponíveis, mas as bases de hoje são as mesmas que os fogueteiros tradicionais utilizavam no século XIX. E essa base consiste essencialmente na arte de saber trabalhar a composição da pólvora.

A primeira função da pólvora é lançar a concha para o ar. Por sua vez, a pólvora que se encontra no interior da concha, tem como papel fornecer a energia suficiente para “acender” as estrelas. Por esta razão, a esta pólvora é adicionada perclorato de potássio ou clorato de potássio. Estes compostos são mais explosivos que os nitratos e por isso fornecem temperaturas mais elevadas – necessárias para que o material das estrelas entre em combustão. Os cloratos possuem a desvantagem de serem muito instáveis e por isso mais perigosos – um composto de clorato pode explodir apenar por cair ao chão. Uma preocupação mais, numa atividade com riscos de segurança elevados.


Mas… e a cor?

Os fenómenos responsáveis pelas cores do fogo de artifício estão presentes nas luzes lá de casa, nos anúncios luminosos e até quando nos aquecemos junto à lareira. Assim, para além da luminescência, os elementos podem também emitir cor por aquecimento – quem já não observou as brasas de carvão que de pretas, passam a vermelhas, alaranjadas até terminarem como cinzas brancas? A este fenómeno os químicos chamam incandescência.

Metais como alumínio ou o magnésio, quando aquecidos a elevadas temperaturas, emitem uma luz branca muito brilhante. Estes elementos são muitas vezes adicionados à pólvora da concha aumentando assim a claridade da explosão. As restantes cores resultam da mistura química que se encontra no interior das estrelas. A composição desta mistura é praticamente igual à pólvora negra, variando apenas o sal que contém o elemento químico que gera a cor por luminescência. Ou seja, para se obter a cor vermelha mistura-se nitrato de estrôncio, carvão e enxofre enquanto para se obter a cor verde mistura-se nitrato de bário, carvão e enxofre. A cor azul é considerada a mais difícil de obter devido à instabilidade dos compostos de cobre. E da mesma forma que o pintor mistura o azul e o vermelho para obter o violeta, também os pirotécnicos misturam cobre e estrôncio para obter esta cor. Alguns foguetes podem começar com uma cor e terminar com outra, uma vez que no interior da mesma estrela podem existir duas misturas. E cada estrela, cada mistura, é preparada artesanalmente, num trabalho que envolve química, arte e muito, muito rigor.


Fogo de artifício ecológico

Para além dos bem conhecidos problemas de segurança, a beleza dos fogos de artifício tem outro senão: a poluição. E há esforços no sentido de encontrar a fórmula adequada para um fogo de artifício mais amigo do ambiente. Assim, em alguns espetáculos, os foguetes são enviados para o ar graças a um sistema de gás compressor, o que evita a utilização da pólvora no momento do lançamento. Desta forma, diminui a libertação de gases poluentes como os NOx, CO e SOx. Também os percloratos utilizados como explosivos no interior das estrelas são identificados como prejudiciais à saúde humana e por isso os químicos tem procurado substituí-los.


FIGURA 3. Exemplo de um composto pirotécnico rico em nitrogénio: a bistetrazoleaminotetrazina. A libertação de energia destes compostos não envolve reações de oxidação do carbono – que ocorrem nas misturas pirotécnicas tradicionais – e os produtos de reação são essencialmente os gases N2 e H2.

Os compostos com elevada percentagem de nitrogénio, como os derivados do triazole e da tetrazina (FIGURA 3), ou de oxigénio, como a nitrocelulose, têm-se revelado muito eficazes nesta área, proporcionando quase sempre uma combustão completa, praticamente sem libertação de fumos – o que permite diminuir também a quantidade de sais e intensificadores de cor utilizados. Tudo para que seja possível admirar um espetáculo de fogo de artifício, livre de sentimentos de culpa!