A tarefa de Editor convidado de um fascículo da Revista de Ciência Elementar surge-me sempre como um desafio simultaneamente aliciante e intimidante. Esta dupla sensação resulta do facto de a revista ser um importante elo entre a Casa das Ciências e os professores de ciências dos diferentes níveis de ensino. De cada editor convidado espera-se que seja capaz de contribuir para uma revista apelativa, motivadora, capaz de fortalecer essa ligação com os seus leitores. Naturalmente, espera-se também que imprima uma marca pessoal no fascículo sob sua responsabilidade - e é esse o tema deste editorial.

Começo por repetir uma parte do texto que escrevi quando me encontrei em situação idêntica, num fascículo anterior: “A Revista de Ciência Elementar vive dos contributos dos autores e cada fascículo representa de alguma forma o fluxo de textos submetidos para publicação”. Ou seja, o editor seleciona os trabalhos que considera mais adequados para o seu fascículo de entre os contributos disponíveis no momento. Os leitores julgarão, mas acredito que o conjunto de textos reunidos nas páginas seguintes tem de deixar o editor satisfeito. E aproveito para agradecer a todos os autores que contribuíram para este fascículo, bem como aos que submeteram trabalhos que ficarão para os fascículos seguintes (o editor do próximo número gostará de os ter ao seu dispor). E, a talhe de foice, recordo que os textos na edição impressa da revista estão limitados no seu número de páginas por opção editorial, mas a versão completa dos mesmos pode ser encontrada na edição digital, disponível no portal da Casa das Ciências.

na edição digital, disponível no portal da Casa das Ciências. O carácter pessoal do Editor acaba por se refletir de forma mais vincada nas escolhas das imagens que abrem e fecham o fascículo, ou seja, a “Capa” e a “Imagem de destaque”. De alguma forma, são as imagens que mais contribuem para a identidade de cada fascículo - porque estão em destaque e porque são as imagens que a memória melhor retém. Tentei, por isso, escolher imagens que pudessem ser associadas a um tema do fascículo. Em ambos os casos, a escolha pretende homenagear, embora por abordagens distintas, a personalidade cuja biografia faz a abertura deste fascículo: Dorothy Crowfoot Hodgkin, ou simplesmente Dorothy Hodgkin, notável cientista e cristalógrafa, que recebeu o prémio Nobel da Química em 1964 “pela (sua) determinação das estruturas de importantes substâncias bioquímicas por técnicas de raios X” (www.nobelprize.org/prizes/chemistry/1964).

Como a imagem de capa também obedece a critérios estéticos, não foi possível encontrar uma imagem diretamente relacionada com as estruturas estudadas por Dorothy Hodgkin. A escolha recaiu numa fotografia de cristais de sacarose, obtida por microscópio sob polarização cruzada. Esta fotografia, premiada numa competição internacional de imagens de microscopia em 2019 (www.wikisciencecompetition.org), consegue captar o encanto - aqui com duplo significado de beleza e magia - dos padrões cristalinos. E são os padrões cristalinos que estão na base da determinação de estruturas por difração de raios X.

Pelo seu lado, a “Imagem de destaque” remete para estrutura tridimensional que constituiu o grande desafio - pelo menos em termos de extensão temporal - de Dorothy Hodgkin: a da hormona peptídica insulina, um desafio abraçado em 1934 e concluído em 1969. A imagem escolhida celebra também a descoberta da insulina como tratamento da diabetes, tal como descrito pela autora da composição gráfica no seu testemunho. Esta descoberta, que mereceu o prémio Nobel da Medicina em 1923 (www.nobelprize.org/prizes/medicine/1923) faz este ano um século, efeméride que está a ser assinalada a nível nacional (www.100anosinsulina.pt) e internacional (www.endocrine.org/membership/100-years-of-insulin). Deste modo, a Revista de Ciência Elementar associa-se também às comemorações dos 100 anos da descoberta da insulina, um feito científico de enorme impacto na vida de milhões de pessoas e um passo marcante na história da medicina.