Avaliação do serviço prestado por macrófitas na depuração de águas: estudo de caso
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- * ES Aurélia de Sousa
- ɫ ES Aurélia de Sousa
- ‡ LA/i3S
- + LA/i3S
Referência Martins, P., Lopes, M., Costa, J., Moreira, A., (2024) Avaliação do serviço prestado por macrófitas na depuração de águas: estudo de caso, Rev. Ciência Elem., V12(2):020
DOI http://doi.org/10.24927/rce2024.020
Palavras-chave Macrófitas, Qualidade da Água, Depuração
Resumo
Para avaliar o serviço das macrófitas na depuração de água doce superficial, montaram-se dois aquários, A e B, com cinquenta litros de água e quatro peixes vermelhos idênticos, sendo que apenas no aquário A foram colocadas macrófitas emergentes. Os peixes foram alimentados de igual forma, com alimento para peixes de água fria, e não foi colocado filtro artificial em nenhum dos aquários. Feitas observações e realizadas análises físico-químicas e microbiológicas, concluiu-se que a presença de macrófitas contribuiu para melhorar a qualidade da água.
A água constitui um recurso essencial para a manutenção dos ecossistemas, para a vida humana e para o desenvolvimento socioeconómico. Por ser um recurso indispensável, a qualidade e disponibilidade da água são condições inerentes à sustentabilidade ambiental, sendo urgente monitorizar e arranjar soluções que visem a proteção da qualidade ecológica das massas hídricas superficiais e dos organismos aquáticos que as integram.
Atividades no âmbito industrial, agrícola e urbano, associados ao contexto das alterações climáticas, têm vindo a criar uma crescente pressão sobre os ecossistemas, ameaçando o equilíbrio ecológico. Através das ETAR, Estações de Tratamento de Águas Residuais, tratam-se águas residuais de origem doméstica e industrial, de forma a reduzir a carga de contaminantes antes de chegarem aos rios e ao mar. De referir, no entanto, a existência de contaminantes emergentes, como fármacos e compostos químicos de pesticidas, que ultrapassam a barreira das ETAR e começam a revelar um impacte ambiental relevante e preocupante em contexto de desenvolvimento sustentável.
As macrófitas são plantas macroscópicas aquáticas, emergentes, submersas ou flutuantes, que podem ser usadas no tratamento de águas residuais domésticas ou como biofiltros para a remoção de microrganismos patogénicos da água. As macrófitas aquáticas submersas possuem um papel fundamental na reciclagem de todos os nutrientes do ecossistema aquático, alterando os valores paramétricos inerentes. De acordo com Almeida & Almeida, em 20061, o emprego das macrófitas aquáticas em tanques artificiais representa um sistema bastante estudado para aquicultura, ocorrendo eficiência na redução das concentrações de poluentes inorgânicos, metais pesados, substâncias tóxicas e de microrganismos patogénicos de que constitui exemplo a bactéria Escherichia coli.
As diatomáceas são microalgas abundantes em ambientes sobretudo aquáticos, de água doce e marinhos, com cerca de duzentos géneros e 105 espécies, podendo constituir bons bioindicadores da qualidade da água e revelando preferência por ambientes aquáticos com elevada carga orgânica. Na FIGURA 1 (A2 a A6) pode estabelecer-se uma relação entre alguns géneros de diatomáceas e a respetiva qualidade da água onde se observa a sua presença.
Constitui objetivo deste trabalho investigar de que forma a presença de macrófitas permite salvaguardar a qualidade da água, acarretando a melhoria de parâmetros físico-químicos e microbiológicos.
Metodologia.
A montagem experimental consistiu em dois aquários iguais, cada um com cinquenta litros de água e quatro peixes vermelhos semelhantes. No aquário-piloto foram colocadas diversas macrófitas emergentes, recolhidas em março e numa ribeira próxima da escola, enquanto no aquário controlo não foi introduzida essa variável.
Os peixes foram alimentados com a mesma frequência e quantidade de comida, nos dois aquários.
Foram realizadas duas colheitas de água, respetivamente em 9 de março (aquando da montagem experimental) e em 20 de abril, tendo as mesmas sido sujeitas a análises físico-químicas e microbiológicas, de acordo com a TABELA 1.
Resultados.
Na FIGURA 2 pode observar-se a montagem experimental com o aspeto inicial, em nove de março.
Nas FIGURAS 3 e 4 estão evidenciados, respetivamente, o aspeto final do aquário-piloto e o aspeto final do aquário-controlo, em 20 de abril. É notório o aspeto límpido da água e do vidro frontal do aquário-piloto (FIGURA 3), o aspeto mais túrbido da água e a presença de microalgas no vidro frontal, no caso do aquário-controlo (FIGURA 4).
Na TABELA 2 estão registados os resultados das análises laboratoriais realizadas à água recolhida nas duas amostragens (9 de março e 20 de abril de 2023). De referir que a data de 9 de março coincidiu com a fase inicial da montagem experimental, sendo as condições de partida iguais nos dois aquários.
No dia 2 de maio, foram observadas ao microscópio as manchas castanhas presentes nos dois aquários mas muito mais abundantes no aquário-controlo (aquário sem a presença de macrófitas). Constatou tratar-se de diferentes espécies de diatomáceas, conforme ilustrado na FIGURA 5.
De referir ter-se observado que as manchas castanhas de diatomáceas, visíveis no aquário com macrófitas, se localizaram preferencialmente em locais afastados destas últimas.
Discussão e Conclusões:
Na presença de macrófitas, observou-se a diminuição do número de bactérias patogénicas de origem fecal, provavelmente e tal como refere Van Kaick, devido ao efeito antibiótico de secreções radiculares e do biofilme que envolve as raízes das plantas aquáticas. No que respeita a redução da concentração de Azoto e de Fósforo, as macrófitas fazem a respetiva assimilação para constituição de material celular. Da mesma forma, o Manganês e o Ferro parecem ser absorvidos pelas macrófitas no seu processo de nutrição, tendo ocorrido a redução da respetiva concentração na água do aquário-piloto.
No respeitante à dureza da água e concentração de alguns elementos minerais cujo valor aumentou nos dois aquários, em relação ao valor inicial, essas alterações poderão dever-se a componentes da comida para peixes deitada na água, por vezes em excesso, não sendo totalmente consumida.
De acordo com os resultados da atividade experimental, as macrófitas contribuíram para a melhor da qualidade da água do aquário-piloto (aquário com macrófitas), relativamente à do aquário-controlo (aquário sem macrófitas). Esta situação sugere a importância da presença de macrófitas como forma de depuração natural inerente ao desenvolvimento sustentável.
A presença de diatomáceas, dominante em locais sem macrófitas e quase inexistente em locais onde se observam estas últimas, sugere alguma interação antagónica entre ambas que poderá constituir um interessante aspeto a investigar posteriormente.
O estudo comparativo das diatomáceas presentes, respetivamente, no aquário-piloto e no aquário-controlo, revelou a existência de algumas diferenças nas espécies presentes, embora a sua identificação requeira um conhecimento mais aprofundado na área. No entanto, seria interessante verificar se a presença de espécies de diatomáceas bioindicadoras coincide com a previsão inerente aos parâmetros físico-químicos determinados laboratorialmente.
De acordo com as caraterísticas ecológicas de diatomáceas, a sua presença poderá acarretar alterações notórias na evolução da qualidade da água dos dois aquários, invalidando o prolongamento do atual estudo pela introdução de novas variáveis, não controladas pelos investigadores.
O estudo realizado abre novas perspetivas de investigação em meio escolar, nomeadamente a de comparar o potencial depurador de dois géneros de macrófitas emergentes e concluir qual deles melhor contribui para a alteração de cada um dos parâmetros analisados.
Agradecimentos
O Artigo foi elaborado com alunos de 12.º ano de Ciências e Tecnologias da Escola Secundária Aurélia de Sousa, no contexto investigativo do projeto SEI desenvolvido no Laboratório da escola. O projeto SEI - Sociedade, Escola e Investigação, integra desde 2015, o programa Porto de Conhecimento da Câmara Municipal do Porto, através da Direção Municipal de Educação, e assenta na celebração de protocolos tripartidos entre o Município, uma Escola Pública e uma Instituição de Ensino Superior/Centro de Investigação. Ao longo de um ano letivo, os alunos do 3.º CEB e do ES são desafiados a desenvolver um projeto de investigação científica sobre problemáticas da vida identificadas dentro ou fora da escola, com o apoio de investigadores da entidade parceira e supervisão de um docente da escola.
Agradecimento ao Laboratório Águas e Energia do Porto pelas análises de parâmetros físico- químicos de amostras de água realizadas.
Referências
- 1 ALMEIDA, R. A. & ALMEIDA, N. A. M., Remoção de coliformes do esgoto por meio de espécies vegetais, Revista Eletrónica de Enfermagem, v. 7, n. 3, p. 306-317. 2006.
- 2 BARGHOUTHI, M. R., A relação entre macrófitas aquáticas submersas, qualidade da água e sedimentos no reservatório de Jupi, Tese de Licenciatura em Engenharia Florestal, Curitiba, Brasil. 2019.
- 3 DIAS, F. S. et al., Aplicação de macrófitas aquáticas para tratamento de efluente doméstico, Revista Ambiental, V.2, n. 1, p. 106-115, Out./15 a Jun./2016. 2016.
- 4 HASLE, G. R. et al., Identifying Marine Diatoms and Dinoflagellates, Academic Press, San Diego, 5–385 pp. 1997.
- 5 KALE, A. & KARTHICK, B., The diatoms: Big significance of tiny glass houses, Resonance, 20: 919–930. 2015.
- 6 SANTOS, M. et al., Comunidade de diatomáceas como bioindicador da qualidade da água – uma atividade prática, Captar – Ciência e Ambiente para todos, V.7, n.1, p.68-78. 2018.
- 7 VAN KAICK, T. S., Estações de tratamento de esgotos por meio de zona de raízes: uma proposta de tecnologia para saneamento do litoral do Paraná, Curitiba, Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná, Brasil. 2002.
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