A secreção em plantas é um fenômeno que integra o metabolismo de todas as células vivas1, compreendendo processos de transferência de substâncias de um local para outro dentro da célula, ou desta para espaços intercelulares ou superfície externa do corpo vegetal2. O material secretado pode possuir diferentes naturezas — como água, soluções salinas, enzimas e metabólitos secundários —, pode incluir numerosas substâncias em sua composição — como no néctar, látex e óleos essenciais —, e apresentar predominância de uma ou algumas substâncias, refletindo especificidade na atividade secretora3.

Estruturas secretoras especializadas podem estar envolvidas na síntese das substâncias secretadas, como em idioblastos, tricomas glandulares e células que delimitam canais, ou secretar substâncias provenientes do sistema vascular, como em nectários, hidatódios e glândulas de sal4. Muitos produtos naturais de importância econômica são produzidos em estruturas secretoras de plantas, e suas secreções apresentam variadas funções biológicas, podendo atuar na defesa vegetal contra herbívoros e microrganismos, na atração de polinizadores e na dispersão de sementes5, 6.

Apesar da elevada importância nessas funções biológicas, as substâncias presentes nessas secreções, além de serem muitas vezes tóxicas para outros organismos, são também perigosas para as próprias plantas, visto que muitos de seus componentes são citotóxicos às células vegetais7. À vista disso, o alto risco de auto-toxidez teria desencadeado, nas plantas terrestres, uma série de tentativas para acumular altas concentrações dessas substâncias sem causar danos à própria planta. Uma dessas tentativas teria induzido, por exemplo, o surgimento das estruturas secretoras e armazenadoras em vegetais7.

O surgimento de estruturas secretoras ocorreu diversas vezes ao longo do processo evolutivo e de forma independente. Os oleocorpos, que são organelas associadas à produção de secreções, foram as primeiras estruturas secretoras em registro fóssil e pertencem à espécie hepática, atualmente conhecida como Mylia taylorii, Marchantiophyta7. Os tricomas secretores, importantes estruturas nas plantas terrestres, têm os primeiros registros entre os períodos Carbonífero e Devoniano em fósseis de samambaias. Contudo, a diversificação dessas estruturas só ocorreu com a radiação das angiospermas no período Cretáceo8.

Atualmente, observa-se expressiva diversidade morfológica de estruturas secretoras em órgãos vegetativos e reprodutivos. Estas estruturas podem ser classificadas em internas, se presentes no interior do corpo vegetal, ou externas, se localizadas na superfície do vegetal. Além disso, podem ser unicelulares ou multicelulares9, 10, 11. Alguns exemplos de estruturas secretoras são idioblastos, tricomas, cavidades e canais.

Idioblastos são células isoladas que diferem das adjacentes em sua forma, tamanho, estrutura da parede e/ou conteúdo, podendo conter cristais, taninos, óleos, mucilagem, mirosina, entre outros12. Cristais de oxalato de cálcio podem ser observados em diferentes formas, tais como os prismáticos, drusas e ráfides, e sua presença é associada a funções biológicas como regulação de cálcio, balanço de íons sódio e potássio, defesa vegetal, suporte mecânico, desintoxicação de metais pesados, captação e reflexão de luz13. Idioblastos secretores de óleos essenciais são considerados diagnósticos para a família Piperaceae e a diversidade química de suas secreções relaciona-se com as diferentes propriedades terapêuticas de suas folhas14.

Na família Brassicaceae, que inclui a espécie-modelo Arabidopsis thaliana, por exemplo, idioblastos denominados “células de mirosina” distribuem-se nos tecidos vasculares na parte aérea da planta, principalmente no parênquima do floema, e acumulam grandes quantidades da enzima mirosinase no vacúolo, convertendo seus substratos em substâncias tóxicas por ocasião do ataque de herbívoros15.

Tricomas são apêndices epidérmicos que podem apresentar estrutura variada e ocorrer em todas as partes do corpo da planta1. São classificados com base em suas características morfológicas, como número de células (unicelulares ou pluricelulares), bem como pela produção ou não de secreções (glandulares e tectores, respectivamente)1, 16. Os tricomas glandulares são frequentemente associados à proteção das plantas contra herbivoria, ação de patógenos e estresses abióticos17, 18. A família Lamiaceae, que inclui numerosas espécies de importância econômica como Salvia officinalis (sálvia), Mentha × piperita (hortelã-pimenta) e Rosmarinus officinalis (alecrim), é caracterizada pela presença de tricomas glandulares dos tipos capitado e peltado, sendo esse último o principal sítio de produção de óleos essenciais no grupo19.

Cavidades e canais secretores são estruturas secretoras internas que são resultado da dissolução de células (lisígenos) ou de sua separação (esquizógenos). Nesse caso, as substâncias são secretadas em espaços intercelulares, delimitados por células secretoras especializadas, sendo que nos espaços lisígenos as células da periferia estão parcialmente desintegradas e as de espaços esquizógenos, estão, geralmente, intactas. São denominados cavidades secretoras os espaços secretores curtos, enquanto os longos são chamados de canais secretores1, 16. Em frutos de Citrus sinensis (laranja) e Citrus limon (limão siciliano), da família Rutaceae, cavidades secretoras de óleos essenciais ricos em monoterpenos desenvolvem-se por sobreposição de processos esquizógenos e lisígenos20. Em Asteraceae, canais são frequentemente associados ao sistema vascular ou localizados lateralmente aos feixes, como observado em folhas de Mikania glomerata e Mikania laevigata (guaco)11, 21.

As estruturas secretoras também podem ser classificadas de acordo com o tipo de secreção que produzem. Os testes histoquímicos permitem indicar a presença de classes químicas em células e tecidos6. Para isso, é necessário a utilização de reagentes e corantes específicos que reagem com a substância secretada. A análise histoquímica geralmente é realizada para identificar carboidratos, proteínas, lipídios, compostos fenólicos e alcaloides, podendo ser geral ou específica. De acordo com a descrição de Dermaco, em 2017, para a detecção de substâncias hidrofílicas, por exemplo, pode-se aplicar solução de vermelho de rutênio em cortes do material fresco, método que cora mucilagens ácidas, pectinas e ácidos nucleicos em magenta ou vermelho. Para identificar alcaloides pode-se utilizar o reagente de Dragendorff que marca essas substâncias em vermelho-marrom6. Na detecção de substâncias lipídicas pode-se aplicar solução Sudan III, que cora os lipídios de amarelo-alaranjado ou vermelho e para a detecção de compostos fenólicos pode-se aplicar solução de Cloreto férrico 10%, que produz coloração negro-azulada ou verde escuro em compostos fenólicos22. A FIGURA 1 apresenta estruturas secretoras em angiospermas, algumas delas com secreções evidenciadas por meio de testes histoquímicos.


FIGURA 1. Estruturas secretoras de angiospermas em secção transversal. A)—E), Folhas. F) Caule. A), B) Tricomas glandulares (seta e cabeça de seta) em Plectranthus barbatus. A) Corado com cloreto férrico 10% (seta), substâncias fenólicas evidenciadas em negro. B) Corado com Sudan III 0,5%, substâncias de natureza lipídica evidenciadas em vermelho (seta). C) Tricoma glandular (seta) em Varronia curassavica. D) Canal secretor (seta) em Mikania glomerata. E) Idioblasto corado com Sudan III (seta) em Monteverdia communis, substâncias de natureza lipídica evidenciadas em vermelho. F) Idioblasto evidenciando a presença de ráfides (seta) em Asplundia brachypus. C), D), F) Corado com safranina-azul de astra 1:9. A), C), E), F) Barra=30μm. B), D) Barra=60μm.

Essas diversas estruturas secretoras são responsáveis por produzir ou armazenar substâncias de composição química muito variada, com diversas funções e utilidades. Como exemplo dessas substâncias, destacam-se os óleos essenciais (OEs) que são sintetizados e armazenados nas plantas em estruturas externas, como tricomas, e estruturas internas como células, canais e cavidades secretoras23, 24, 25. Os OEs compreendem uma mistura complexa de substâncias químicas voláteis, normalmente de natureza lipídica, derivadas do metabolismo secundário de plantas que podem ser extraídos de flores, frutos, sementes, folhas, caules e raízes23. Esses óleos podem ser obtidos através de diferentes técnicas de extração, como hidrodestilação, arraste a vapor de água, enfloração, prensagem a frio e extração com fluido supercrítico. Os métodos de obtenção variam de acordo com a finalidade, parte da planta e composição química do óleo que deseja ser extraído25.

Na composição dos OEs se destaca a presença de terpenos, principalmente mono- e sesquiterpenos23. Os OEs podem apresentar diversas atividades biológicas como anti-inflamatória, antimicrobiana, repelente e contra o ataque de herbívoros, variando de acordo com os componentes bioativos presentes23, 24. O óleo essencial de alecrim (Rosmarinus officinalis), por exemplo, possui atividade anti-inflamatória devido, principalmente, à presença de monoterpenos que impedem a síntese de mediadores pró-inflamatórios26. Com ação repelente, pode-se destacar o óleo essencial de citronela (Cymbopogon nardus) que possui ação sobre o sistema nervoso central do inseto, provocando paralisia27. Além disso, os OEs atuam no mecanismo de sinalização envolvido na comunicação entre as plantas, na proteção contra a perda de água e aumento de temperatura25.

Essas substâncias possuem alto valor agregado por suas atividades biológicas e por serem de origem natural, e portanto, são biodegradáveis e renováveis24. Ressaltam-se seus usos na indústria farmacêutica, de alimentos e cosméticos24. Dessa forma, as plantas destacam-se pela sua importância na síntese e estocagem dos óleos essenciais em estruturas secretoras, os quais possuem grande relevância econômica, ecológica e terapêutica.