Embora não seja muito comum, usamos algumas flores na nossa alimentação. Não se trata daquelas pétalas que aparecem nos pratos gourmet, nem de especiarias como o cravinho (Syzygium aromaticum) ou o açafrão (Crocus sativus), mas sim de flores de algumas variedades de couve (Brassica oleracea), como a couve-flor, os bróculos ou a couve-romanesca. Nestas crucíferas, a seleção artificial e a consequente modificação genética das plantas, praticadas pelos humanos há milhares de anos, conduziram à seleção de características ligadas a uma floração contínua. Noutras couves, a seleção foi no sentido de promover folhas grandes (couve-galega) ou meristemas axilares (couve-de-Bruxelas).

Nestes três exemplos de flores (na verdade, inflorescências) comestíveis, a base genética das modificações é a mesma, mas a forma como o meristema inflorescencial funciona é diferente. Na couve-flor, o meristema prolifera, mas a diferenciação floral não é completa, formando-se uma massa compacta de meristemas de cor branca, devido à falta de diferenciação das peças florais e consequente ausência de clorofila ou de outros pigmentos. Pelo contrário, nos bróculos, a inflorescência origina um conjunto de flores em que a diferenciação das peças florais é completa. Já na couve-romanesca, o processo é intermédio, com a formação de um padrão regular de flores fechadas. Nesta variedade, a disposição das flores segue um padrão regular de distribuição em espiral, que se orienta quer no sentido dos ponteiros do relógio, quer em sentido contrário. O número de espirais em cada direção (8 e 13, respetivamente) segue números consecutivos de uma série de Fibonacci, o que ocorre devido à disposição consecutiva das flores à volta do meristema inflorescencial, obedecendo a um ângulo de 137,5° (o chamado ângulo dourado).

A couve-romanesco não apresenta apenas séries de Fibonacci; é também um fractal natural. Cada pequena flor é uma miniatura da inflorescência, e, à medida que ampliamos a observação, vemos estruturas em espiral cada vez mais pequenas.

Importa referir que estas organizações particulares das inflorescências se devem principalmente a três genes: AP1 (APETALA1), CAL (CAULIFLOWER) e TFL1 (TERMINAL FLOWER 1), cujos nomes são, em grande parte, autoexplicativos.

Quem disse que não pode haver beleza na Matemática?

Jorge Manuel Canhoto
Universidade de Coimbra