Bisafe Portugal
Blooms de Microalgas e consumo de bivalves em Portugal
📧 , 📧 , 📧 , 📧 , 📧
- * Agrupamento de Escolas João de Deus, Faro
- ɫ Agrupamento de Escolas João de Deus, Faro
- ‡ Agrupamento de Escolas João de Deus, Faro
- + Agrupamento de Escolas João de Deus, Faro
- # Agrupamento de Escolas João de Deus, Faro
Referência Barracosa, H., Kobozev, Y., Fornea, A., Silva, I., Silvestre, A., (2017) Bisafe Portugal, Rev. Ciência Elem., V5(3):038
DOI http://doi.org/10.24927/rce2017.038
Palavras-chave Bivalve; alga; biotoxina; ensino;
Resumo
Certas microalgas produzem compostos bioativos – as biotoxinas marinhas - capazes de causar intoxicações agudas no Homem quando concentrados por certos animais. Os moluscos bivalves podem exercer esta função e podem ser responsáveis por danos graves na saúde humana.
O tema central do projeto BiSafe Portugal está relacionado com este problema ou seja as biotoxinas marinhas produzidas por microalgas e as graves consequências do consumo de bivalves contaminados.
A ingestão de moluscos bivalves portadores de biotoxinas e as consequências ao nível da saúde do consumidor leva à publicação de avisos de interdição de apanha/comercialização por parte do IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera). Contudo a informação oficial disponibilizada é pouco amigável e efetiva para o cidadão comum que quer uma resposta rápida sobre se pode ou não pode apanhar, comprar ou consumir bivalves. O desafio foi descodificar uma linguagem técnica, altamente complexa, para uma linguagem popular, sem perda de rigor na qualidade da informação. BiSafe Portugal resulta de um projeto de âmbito regional e base escolar iniciado no ano letivo transato onde foi desenvolvida uma app (aplicação para dispositivos móveis), sobre as interdições de captura no Algarve e baseada em dados oficiais retirados dos comunicados emitidos pelo IPMA. Esta app permite ao consumidor, mariscador ou comerciante saber, de uma forma rápida e em tempo real, se é seguro consumir, capturar e/ou comercializar bivalves sem descurar o rigor da informação prestada. Desta forma é o próprio consumidor que se torna agente de mudança contribuindo para uma melhoria do controlo sanitário deste produto de excelência e de grande importância económica no nosso país.
A captura e comercialização de bivalves nas zonas costeiras litorais algarvias e a moluscicultura na Ria Formosa (e na Ria de Alvor) constituem uma das atividades de maior significado económico da região algarvia no quadro da exploração dos recursos vivos naturais, devido às condições favoráveis dos ecossistemas. A Ria Formosa é a maior zona produtora de bivalves em Portugal, sobretudo ameijoa boa (Ruditapes decussatus), envolvendo 1 600 licenças de exploração e cerca de 10 000 empregos. O tema central deste projeto relaciona-se com a ocorrência de blooms sazonais de microalgas produtoras de biotoxinas (HAB, Harmful Algal Blooms) e as suas consequências. As biotoxinas são compostos naturais produzidos por espécies de fitoplâncton e que são filtrados por bivalves (ameijoas, conquilhas, berbigões, ostras, mexilhões...) e acumulados nos mesmos. Sazonalmente, as microalgas libertam este tipo de toxinas que podem, em caso de ingestão, ter graves consequências para a saúde humana designadamente diarreias graves, amnésia ou a paralisia de órgãos vitais, dependendo do tipo de toxinas produzidas pelas microalgas. Estão inclusivamente documentados em Portugal casos letais derivados do consumo de bivalves contaminados. Nas regiões temperadas do planeta, tais como Portugal, os bivalves são os principais vetores de intoxicações esporádicas. Por essa razão são realizadas periodicamente análises tanto à água como aos bivalves e os resultados são tornados públicos pelas autoridades marítimas traduzindo-se na publicação de avisos de interdição de apanha por parte do IPMA, nas áreas de produção e de acordo com normas europeias, transpostas para legislação nacional.
Como Laboratório Nacional de Referência em Biotoxinas Marinhas, o IPMA é a entidade em Portugal responsável pela realização e divulgação de análises regulares aos bivalves em termos de biotoxinas. Contudo a informação disponibilizada no site do IPMA é pouco amigável e efetiva para utilização pelo cidadão comum que quer uma resposta rápida sobre se pode ou não pode apanhar, comprar ou consumir bivalves. O desafio foi descodificar uma linguagem técnica, altamente complexa, para uma linguagem popular, sem perda de rigor na qualidade da informação.
“BiSafe Portugal” resulta de um projeto iniciado no ano letivo transato por um grupo de alunos e professores da Escola Secundária João de Deus (Faro) dos cursos de Ciências e Tecnologia e ainda do Curso Profissional de Multimédia. O produto principal desenvolvido consistiu numa aplicação para dispositivos móveis (em sistema Android) que permite ao utilizador ter uma informação rápida e rigorosa sobre as interdições de captura no Algarve. Esta aplicação tem duas interfaces (Figura 1 e Figura 2): apanhar (destinada ao apanhador profissional ou amador, interface georreferenciada) e comprar (destinada ao consumidor/comerciante). Ambas permitem obter informação contextualizada temporal e espacialmente, em termos de interdição ou não de determinada espécie de bivalves e toda a aplicação se baseia em dados oficiais contendo ainda, a título informativo, uma listagem com imagens das espécies mais comuns que possibilita ao consumidor uma melhor identificação (Figura 3). A aplicação está disponível (em versão Android e para a zona algarvia estuarina-lagunar e litoral de produção de moluscos bivalves) podendo ser descarregada gratuitamente em https://play.google.com/store/apps/details?id=aejd.bisafe.
Contudo “BiSafe Portugal” apesar de ter como alvo principal o desenvolvimento da app não se esgota neste produto. A presença de biotoxinas nos moluscos bivalves é um assunto recorrente particularmente no verão, mediático, controverso e logo com um grande impacte social e económico. Paralelamente ao desenvolvimento da app, foram realizados estudos de base sociológica sobre a perceção do problema pelo consumidor de bivalves. Os resultados obtidos apontam para um grande desconhecimento das consequências da ingestão de bivalves contaminados, uma desconfiança relativamente à informação veiculada pelo IPMA e ainda a existência de “mitos” relacionados com a eliminação de biotoxinas (e.g. as biotoxinas são eliminadas pela depuração, congelação ou fervura). Não existem praticamente estudos sobre o tema e muitos dos bivalves colocados no mercado, sobretudo os vendidos a granel, parecem não cumprir as normas sanitárias e de rotulagem. Isto representa um risco para a saúde pública em Portugal devido à sua possível contaminação por agentes patogénicos e/ou biotoxinas. Estas e outras informações sobre o projeto poderão ser acedidas através do site do projeto disponível em .
O trabalho já realizado (de âmbito regional) permitiu lançar bases para que, no presente ano letivo, se possa ampliar a base de investigação e introduzir novos objetivos (de âmbito nacional) num projeto de continuidade designado “BiSafe Portugal”:
- Desenvolver uma aplicação informática amigável para dispositivos móveis sobre as interdições de captura para comercialização ou consumo válida em Portugal para todas as espécies objeto de análise por parte do IPMA que possa ser utilizada em qualquer dispositivo móvel do tipo smartphone ou seja em sistema Android, iOS e Windows.
- Recolher dados a nível nacional, acerca do conhecimento da população e comportamentos associados enquanto consumidores, comerciantes ou apanhadores de bivalves/mariscadores.
- Estabelecer contactos com escolas europeias localizadas em zonas análogas de produção de bivalves com vista ao estabelecimento de parcerias e internacionalização do projeto, uma vez que o fenómeno é global e atinge outras áreas costeiras europeias.
Em termos metodológicos o projeto segue a metodologia de trabalho de projeto e de resolução de problemas, configurando uma abordagem científica baseada na formulação de questões iniciais de investigação e na tentativa de as resolver. Por outro lado, a sua abordagem é claramente prática e multidisciplinar mobilizando várias áreas curriculares para o seu desenvolvimento designadamente as ciências exatas e experimentais (estatística, biologia e química), ciências humanas (investigação sociológica), informática, design gráfico/comunicação. O projeto inclui ainda uma vertente de desmultiplicação com o estabelecimento de parcerias nacionais e internacionais (escolas) possibilitando lançar as bases para uma internacionalização do projeto.
Em síntese pensamos que “BiSafe Portugal” poderá contribuir para um aumento do interesse das autoridades nacionais e europeias pelo problema e encará-lo verdadeiramente como um caso de saúde pública direcionando mais meios para a sua resolução. Uma melhoria do controlo sanitário deste produto de excelência pode conseguir-se por pressão de consumidores mais informados e atentos a este problema, convertendo os consumidores em verdadeiros agentes de mudança. Ou como refere Carlos Luís, Diretor do Agrupamento de Escolas João de Deus (Faro) “BiSafe Portugal” é um projeto emblemático que reflete a ligação profícua que se pode estabelecer entre a escola e a sociedade”.
Referências
- 1 Manual boas práticas, projeto QUASUS (IPMA, 2013)
- 2 VALE, P, Revista Portuguesa de Ciências Veterinárias. 2004, 99,549
- 3 Regulamento (CE) nº 853/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho de 29 de Abril de 2004, JO L226 de 25.06.2004
- 4 Despacho n.º11610/2016 de 29 de setembro de 2016
- 5 KOBOZEV, Y, Bisafe, Escola Secundária João de Deus, Portugal, 2017 (disponível em https://play.google.com/store/apps/details?id=aejd.bisafe)
Este artigo já foi visualizado 4992 vezes.