A última Cimeira do Clima de Paris, realizada em dezembro de 2017, foi mais um exemplo dessa tarefa complexa. Tal como foram os meetings realizados na década de 80, com vista à problemática da depleção da camada do ozono e que teve como ex-líbris o Protocolo de Montreal. Ou, voltando um decénio atrás, relembrar as discussões em torno das causas que levaram à crise piscícola da costa peruana em 1972/1973, associada a um dos anos mais fortes do El Niño e que afetou por efeito dominó toda a Terra.

Parece que o Homem anda mesmo a fazer das suas (...). Aquele que tem a capacidade de entender como o planeta funciona. E que teve a habilidade de retratar, através da pintura, as frequentes imagens geladas que assolavam o rio Tamisa nos vários invernos do século XVII durante a chamada Pequena Idade do Gelo, sendo que esta crise climática terá acontecido antes da Revolução Industrial. Aliás, o rastilho de todo o processo evolutivo que fez aumentar a concentração de CO2 de 280 ppm para os mais de 400 ppm com que convivemos na atualidade. Um aumento que é, nos dias de hoje, francamente superior ao admitido (cerca de 80 ppm) pelos diversos proxies que nos ajudam a entender a variação climática, ocorrida entre a última das glaciações do Plistocénico (Würm) e o início do nosso Holocénico. O Homem já andava por cá, mas ainda não tinha a capacidade e os meios para alterar a natureza.

A mesma natureza que foi sendo registada nas rochas ao longo de centenas e centenas de milhões de anos. E que permitiu ao Homem especialista na matéria, o geólogo, avaliar que, na sua longa história, o planeta tenha sofrido mudanças (paleo)ambientais radicais, a perder de conta. As mais significativas, com impactos graves na biosfera, são as conhecidas extinções em massa. Aquelas que levaram, por exemplo, à extinção dos dinossauros, no final do Mesozoico ou o maior período de atividade vulcânica reconhecido em todo o Fanerozoico, na transição Paleozoico-Mesozoico, de que terá resultado a maior das extinções.

Não tendo quaisquer evidências sobre estes e muitos outros eventos igualmente marcantes da história da Terra, Portugal é hoje dos locais do mundo que melhor regista, geologicamente falando, um episódio ocorrido há cerca de 182 milhões de anos, em pleno Jurássico! O conhecido evento anóxico oceânico do Toarciano, um intervalo que, como o próprio nome sugere, de anoxia generalizada dos ambientes marinhos, e que está na base do recente projeto financiado pela UNESCO e pela International Union on Geological Sciences, IGCP 655 – “Toarcian Oceanic Anoxic Event: Impact on marine carbon cycle and ecosystems” (http://igcp655-toae.com/). Conforme atestam os resultados da investigação científica que tem sido realizada ao longo dos últimos anos no território lusitano, particularmente nas arribas de Peniche, estamos perante um episódio de grande perturbação do ciclo do CO2 que, entre outras inferições e argumentos, terá sido responsável pelo sobreaquecimento da água do mar e que deixou sequelas no registo biológico, originando uma pequena extinção em massa. Interações que são observadas e aferidas nos estratos sedimentares de Peniche, permitindo entender como funcionam e interagem os diversos sistemas terrestres. Um laboratório natural de excelência e de aprendizagem, longe da intervenção humana. E com muitos milhões de anos!