A criação de Bombyx mori tem revelado grande interesse pedagógico, constituindo uma atividade desenvolvida em numerosas escolas de primeiro e de segundo ciclos de escolaridade básica no âmbito do estudo de metamorfoses. As potencialidades educativas de um projeto de criação de Bichos-da-Seda podem, no entanto, estender-se a níveis mais complexos, nomeadamente no âmbito do ensino e aprendizagem de temas de Genética inseridos em contextos curriculares de Ciências da Vida nos 9º e 12º anos.

O ciclo de vida de Bombyx mori, nas linhagens univoltinas comuns na Europa, ocorre com o nascimento das larvas no início da primavera seguindo-se o respetivo crescimento larvar, construção de casulos e a postura pelas borboletas, cerca de dois meses após a inicial eclosão dos ovos. Nas referidas linhagens, a nova postura mantém-se geralmente até à primavera seguinte, em diapausa por vários meses. Entre os insetos lepidópteros, os Bichos-da-Seda são os mais estudados, como sistema modelo, com um extenso reportório de informação genética em mutações que afetam a morfologia, o desenvolvimento e o comportamento1.

Na Escola Básica Augusto Gil (Porto), com alunos de 9º ano, foi desenvolvido um projeto com o objetivo pedagógico de investigar o modo de transmissão genética de caraterísticas fenotípicas de larvas de Bombyx mori com os três padrões ilustrados na FIGURA 1: larvas brancas, larvas castanhas e larvas com riscas transversais brancas alternando com riscas escuras. Neste nível etário, valorizou-se principalmente o rigor na recolha de dados, na medida em que os alunos do referido ano de escolaridade apenas adquirem conhecimentos básicos de genética, não abordando o conceito de “linkage”.

FIGURA 1. Padrões fenotípicos observados em larvas de Bombyx mori.


O projeto foi implementado entre o início de março e o final de julho, com uma temperatura média de 23ºC, decorrendo as transformações inerentes ao ciclo de vida de Bombyx mori em caixas de cartão, altas e abertas no topo, numa sala onde estores translúcidos impediram permanentemente a entrada de luz direta. A alimentação das larvas foi feita diariamente com folhas frescas de Morus alba, a amoreira branca.

Numa primeira fase do projeto, os alunos contaram as larvas da primeira geração, tendo registado que a população inicial era constituída por 62 larvas das quais 42 eram castanhas (67,7%), 8 eram brancas (12,9%) e 12 apresentavam o padrão riscado (19,4%).

Numa segunda fase do projeto foram proporcionadas condições para o cruzamento de indivíduos pertencentes aos dois padrões fenotípicos mais representados na população inicial: uma larva castanha e uma larva riscada foram isoladas na mesma caixa, tendo os alunos observado a construção dos respetivos casulos, a saída das borboletas, a cópula destas e a postura dos ovos. Todos os ovos foram guardados até à sua eclosão que ocorreu em 26 de maio do mesmo ano, sendo esta segunda geração constituída por um total de 34 larvas, das quais 17 castanhas (50%), 6 brancas (17,6%) e 11 riscadas (32,4%).

Numa terceira fase do projeto, as larvas da segunda geração foram separadas em caixas diferentes, de acordo com o respetivo padrão fenotípico, cruzaram-se entre si e ocorreu nova postura de ovos. A terceira geração nasceu a 31 de julho do mesmo ano, tendo sido registados, pelos alunos, os resultados constantes na FIGURA 2 sob a forma tabelar e gráfica:

FIGURA 2. Resultados de cruzamentos com conhecimento de fenótipos larvares (BxB, RxR e CxC).

Com base nos resultados obtidos e após discussão dos mesmos, aplicando conhecimentos adquiridos no 9º ano de escolaridade básica sobre transmissão de caraterísticas genéticas, os alunos concluíram que:


  • - havia três fenótipos diferentes nas larvas da população estudada de Bombyx mori.
  • - o carater branco é uma linha pura.
  • - o carater riscado é recessivo em relação ao carater castanho.
  • - o carater riscado é dominante em relação ao carater branco.

As conclusões apresentadas revelam limitações inerentes ao nível de ensino em que o projeto foi implementado, podendo o trabalho com alunos de outros níveis conduzir a uma outra expressão de conhecimento.

Nas investigações realizadas no âmbito do projeto, foi abordado o conceito de diapausa no ciclo de vida dos Bichos-da-Seda e a não ocorrência do normal período de pausa, entre a postura e a eclosão dos ovos, suscitou a reflexão e originou novas questões. Na fase de discussão dos resultados e como possível hipótese explicativa da não ocorrência de diapausa, ou do seu encurtamento, alguns alunos referiram a situação de aquecimento inerente a alterações climáticas. Ficou, assim, caminho aberto para outros projetos pedagógicos facilitadores de novas aprendizagens.

O desenvolvimento deste projeto beneficiou da atípica não ocorrência da diapausa mas, em situação normal, será sempre possível desenvolver projetos semelhantes durante um ano letivo, desde que a origem dos ovos esteja identificada com o fenótipo larvar dos progenitores, procedendo os alunos à observação e interpretação genética da descendência.

Para além da consolidação de aprendizagens de conteúdos de genética, o projeto conduziu a melhorias das competências atitudinais dos alunos, nomeadamente no âmbito da responsabilidade, do rigor no registo de observações, do raciocínio científico, da autonomia na implementação de estratégias de ação, da capacidade de organização, do espírito de equipa e da comunicação científica.