A presente imagem propõe tão mais além da sua vocação científica. Fiel ao universo a que se reporta, transcende a sua vocação de modelo de representação, e convida-nos a um olhar polissémico intuitivo: a superfície transparente que envolve a glicoproteína é de súbito metáfora do isolamento que atravessámos, sendo a sua forma esférica um eterno retorno à escala planetária.

A partir desta deambulação semântica, os contornos da glicoproteína formam uma proto- geografia: imaginada mas por isso mesmo falando de todos os territórios de pandemia - onde as manchas e os pontos marcados a cor nos poderão sugerir focos estatísticos de infeção.

Estes modos de intuir a imagem falam também da forma persistente como a patologia em causa tem sido gravada na nossa consciência pela comunicação social: como estatística e como mapa de propagação, comunicáveis por recursos gráficos em tudo paralelos aos que a ciência emprega para revelar o que vive à escala molecular.

Heitor Alvelos
Belas Artes/ Universidade do Porto

O coronavírus SARS-CoV-2 deve o seu nome ao facto de ter uma forma esférica da qual as espículas se projetam, dando a aparência de uma coroa. O conhecimento da estrutura tridimensional da glicoproteína espicular S é de importância vital para o desenvolvimento de vacinas e antivirais que ajudam a combater a doença. Esta glicoproteína é responsável pela aparência em forma de coroa e causa infeção por vírus nas células epiteliais do sistema respiratório, uma vez que reconhece e se liga aos recetores hACE2 (do inglês human Angiotensin- converting enzyme 2), uma enzima ligada à superfície externa das células que diminuem a pressão sanguínea da célula hospedeira.

Na representação da imagem, a glicoproteína S é mostrada como uma superfície molecular branca, com uma parte destacada a vermelho, correspondendo à conformação que interage com o recetor do hospedeiro. Os hidrocabonetos ligados às proteínas são representados em verde limão.

Esta imagem foi criada a partir de coordenadas disponibilizadas no Protein Data Bank (ficheiro PDB 6VSB).

Carola Jerves
DQB/LAQV/ Universidade do Porto