O RNA extracelular


FIGURA 1. Bacteriófago.

O RNA desempenha funções extremamente importantes, quer do ponto de vista estrutural, fazendo parte dos ribossomas, quer no processo de síntese proteica, através de outros dois tipos de RNA o RNA mensageiro e o RNA de transferência. Recentemente demonstrou-se que pequenas moléculas de RNA (microRNAs) estão envolvidas no controlo da expressão de genes que controlam mecanismos de desenvolvimento importantes. Todas estas funções decorrem no interior da célula, no citoplasma ou no núcleo. Torna- se assim ainda mais surpreendente o facto de vários autores terem demonstrado que existem moléculas de RNA fora das células (RNA extracelular, exRNA), protegidas por uma camada lipídica que no seu conjunto se designam por exossomas (Scientific American, Agosto 2020). A sua função é ainda, em grande parte, desconhecida, mas diferentes grupos de investigação tentam perceber o que leva as células a libertar os exossomas e qual o seu papel em mecanismos tão variados como a proliferação de células cancerígenas ou, no caso das plantas, o combate a fungos patogénicos e a compreensão dos mecanismos de enxertia. O seu estudo pode também permitir desenvolver mecanismos mais eficazes de introdução de RNA ou DNA nas células com o objetivo de curar doenças genéticas (terapia génica).



O viroma humano


FIGURA 1. Vírus.

Talvez um pouco fartos de más notícias sobre vírus esquecemos o seu papel positivo. Os humanos, à semelhança de outros organismos, bactérias incluídas, são suscetíveis a infeções por vírus, daí resultando uma valente gripe, ou algo mais sério, como uma infeção pelo vírus do Ébola. Os vírus podem existir nas células ou parasitar bactérias que cada um de nós possui, em número 10 vezes superior ao das células e que são, no seu conjunto, designadas por microbiota. Estes vírus constituem o nosso viroma. Neste contexto, a máxima de Ortega Y Gasset, segundo a qual “o homem é ele próprio e a sua circunstância”, talvez possa ser adaptada para “o homem é ele próprio e o seu viroma”. A descoberta (David Pride, Universidade da Califórnia, Scientific American Dezembro 2020), de que pessoas que coabitam possuem no seu corpo cerca de 25% de vírus comuns mostra, não apenas que cada ser humano possui um viroma único, mas também que esse viroma evolui com o tempo e com o modo de vida. Estas descobertas podem ser muito interessantes em análises forenses permitindo determinar se pessoas partilharam o mesmo espaço. Outro dado curioso é que a diversidade do viroma é menor em países ocidentais, como nos EUA ou países Europeus, do que noutros países, o que pode estar relacionado com a alimentação. O papel do viroma está longe de ser conhecido, mas muitos autores consideram que os vírus podem ser importantes no controlo de bactérias patogénicas.



Células sintéticas


FIGURA 1. Mitose em células do ápice da raiz da cebola (fonte: banco de imagens, Casa das Ciências).

Mas as que há não chegam? Esta pode ser a pergunta que nos vem à cabeça quando ouvimos falar de células sintéticas. Se a biodiversidade celular já é tão grande qual o interesse de termos células criadas em laboratório? E para que servem, afinal? As células eucariotas são entidades complexas, com um grande número de organitos, e onde inúmeras reações decorrem simultaneamente, o que torna difícil analisar mecanismos celulares e moleculares subjacentes a determinadas funções celulares. Assim, o objetivo dos cientistas é criar sistemas mais simples, onde determinados mecanismos possam ser estudados isoladamente. Do ponto de vista evolutivo, estes sistemas simplificados podem também ajudar a compreender o aparecimento das células e muitas empresas biotecnológicas pensam na sua utilização industrial. Craig Venter, conhecido, entre outras coisas, pela sua participação na sequenciação do genoma humano, foi um pioneiro na criação de células sintéticas, remontando os primeiros trabalhos a 2008, através da manipulação de bactérias do género Mycoplasma e que levaram, em 2016, à obtenção da primeira “célula mínima”, designada JCVI-syn3.0, com apenas 473 genes. É discutível que este tipo de entidade possa ser considerado uma célula sintética, mas desde estes trabalhos pioneiros, numerosos grupos de investigação têm tentado obter verdadeiras células sintéticas. A receita parece simples: vesículas lipídicas (lipossomas), material genético no interior e uma maquinaria celular capaz de assegurar a replicação do DNA e a sua distribuição por duas “células” filhas. Trabalhos recentes (Universidade de Delft, Holanda) mostraram que um genoma artificial contendo 4 genes do fago Φ29 é capaz de se replicar em vesículas fosfolipídicas. O futuro é capaz de não estar assim tão longe (https://doi.org/10.1038/ s41467-018-03926-1).