Equações cúbicas e números complexos
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- U. Porto
Referência Santos, J. C., (2023) Equações cúbicas e números complexos, Rev. Ciência Elem., V11(3):031
DOI http://doi.org/10.24927/rce2023.031
Palavras-chave
Resumo
É geralmente referido nos livros de Matemática destinados a alunos do 12.º ano que a origem dos números complexos está ligada à resolução das equações de terceiro grau e à fórmula de Cardano. Este artigo explora as ligações entre os dois tópicos. E há muitas.
Os alunos do 12.º ano aprendem a trabalhar com números complexos. É frequente que se explique neste contexto o que é a fórmula de Cardano (que será exposta mais à frente) e que se diga como pode levar a números complexos não reais, mesmo que a equação só tenha coeficientes reais e que só se esteja interessado em soluções reais. E há um exemplo que é mencionado praticamente sempre: a equação x3−15x−4=0. Historicamente, isto faz sentido, pois este mesmo exemplo já surge no primeiro livro dedicado a este tópico: L’Algebra, de Rafael Bombelli. Este será o ponto de partida para este artigo. Iremos ver o que diz a fórmula de Cardano, o que é que há de especial (se é que há) relativamente à equação atrás referida e outros tópicos relacionados.
As equações cúbicas até Bombelli.
Resolver equações quadráticas é algo que já se sabia fazer na Mesopotâmia, na primeira metade do segundo milénio a.C.2. Como iremos ver, resolver equações cúbicas é algo bastante mais complexo. A primeira pessoa a conseguir um método para resolver todas as equações cúbicas foi Omar Caiam2, um poeta, matemático e astrónomo persa que publicou um livro sobre o assunto no fim do século XI. O método aí exposto, que se baseava numa ideia de Arquimedes, envolvia o uso de Geometria (mais precisamente, interseção de cónicas) para resolver aquelas equações. Aparentemente, Omar Caiam ficou frustrado por o seu método não ser puramente algébrico, pois escreveu:
“Quando, no entanto, o objeto de estudo do problema é um número puro, nem nós nem nenhuma pessoa dedicada à Álgebra foi capaz de resolver esta equação. Talvez outros que virão depois de nós venham a ser capazes de colmatar esta lacuna.”.
Não se vai aqui expor em detalhe a história tortuosa de como surgiu, na Itália do século XVI, um processo algébrico de resolver equações cúbicas1, 2. A chamada fórmula de Cardano consiste numa fórmula para obter uma solução da equação x3+px+q=0, que nos diz que uma tal solução é dada por
3√−q2+√q24+p327+3√−q2−√q24+p327 (1)
e surge no livro Ars Magna, publicado por Cardano, em 1545.
Um aspeto do que acabou de ser escrito que salta imediatamente aos olhos é que a fórmula (1) só nos permite resolver equações cúbicas de um tipo muito restrito. De que é que serve aquela fórmula se se quiser resolver, por exemplo, a equação 2x3+x2+x−1=0? Afinal, não é da forma x3+px+q=0. O próprio Cardano explica, no Ars Magna, como lidar com este problema. O primeiro passo consiste em dividir a equação anterior pelo coeficiente de x3, que é 2, o que dá origem à equação
x3+12x2+12x−12=0 (2)
Claramente, as duas equações são equivalentes, ou seja, têm as mesmas soluções. O passo seguinte consiste em introduzir uma nova incógnita, y, e substituir, na equação anterior, x por y−1/6. Acontece que
(y−16)3+12(y−16)2+12(y−16)−12=y3+512y−3154
E, agora sim, pode-se aplicar a fórmula de Cardano. Temos
p=512,q=−3154 e √q24+p327=√49576=724
Logo, a fórmula de Cardano diz-nos que uma solução da equação
y3+512y−3154=0 (3)
é
y=3√31108+724+3√31108−724=56−16=23
Finalmente, tem-se x=y−1/6=2/3−1/6=1/2.
Só falta explicar um detalhe: porquê tomar x=y−1/6? De onde vem aquele 1/6? Vem do facto de o coeficiente de x2 na equação (2) ser 1/2. A regra geral é a seguinte: se se tem uma equação cúbica do tipo x3+ax2+bx+c=0 e se se fizer a substituição x=y−a/3, obtém-se uma equação do tipo y3+py+q=0. Em particular, se a=1/2, faz-se x=y−1/6.
Está então visto como a fórmula de Cardano permite, de facto, resolver qualquer equação cúbica. Acontece que não é bem assim. Como Cardano se apercebeu, surge um problema quando q2/4+p3/27< 0. Quando isto tem lugar, a fórmula não faz sentido. Ou, pelo menos, não fazia sentido da primeira vez que Cardano se deparou com o problema.
É no Ars Magna que os números complexos surgem pela primeira vez. No entanto, não são mencionados no contexto das equações cúbicas. Surgem pela primeira vez perto do fim do livro, quando Cardano menciona o problema de encontrar dois números cuja soma seja 10 e o produto 40 e dá como solução os números 5+√−15 e 5−√−15. Mas menciona em seguida a “tortura mental” que consiste em trabalhar com tais números e acaba por dizer que são “tão subtis quanto inúteis”.
Quem atacou de frente o problema de usar a fórmula de Cardano em todos os casos, e não apenas quando q2/4+p3/27≥0 foi um contemporâneo e admirador de Cardano, Rafael Bombelli. No seu livro L’Algebra, ele provou que qualquer equação cúbica tem alguma solução3. Logo, quem pensasse que, por analogia com o que acontece com a fórmula resolvente das equações quadráticas, o facto de se ter q2/4+p3/27< 0 seria uma indicação de ausência de soluções estaria enganado. E é também naquele livro que surge a famosa equação cúbica x3−15x−4=0. Bombelli faz notar que, como facilmente se pode verificar, 4 é solução desta equação. Mas se a tentarmos resolver usando a fórmula de Cardano, obtemos
x=3√2+√−121+3√2−√2−√−121
Bombelli aproveita o facto de se ter 121=112 para escrever a expressão anterior sob a forma
x=3√2+11√−1+3√2−11√−1
Em seguida, observa que
(2+√−1)3=22+3×22×√−1+3×2×√−12+√−13=8+12√−1−6−√−1=2+11√−1
e um cálculo análogo mostra que (2−√−1)3=2−11√−1. Logo, afirma Bombelli,
x=3√2+11√−1+x=3√2−11√−1=2+√−1+2−√−1=4
Cúbicas de Bombelli.
Este exemplo é excelente, do ponto de vista pedagógico, para explicar como surgiram os números complexos. Os cálculos são fáceis de levar a cabo e permitem ver como obter a solução que já se sabe que existe. Mas haverá mais exemplos deste tipo? Vamos clarificar o que é que se entende por “este tipo”.
Para começar, observe-se que a fórmula de Cardano pode ser reescrita sob a forma
x=3√−q2+√(q2)2+(p3)2+3√−q2−√(q2)2+(p3)2
Logo, se quisermos trabalhar o mais possível com números inteiros, convém que p seja um inteiro múltiplo de 3 e que q seja um inteiro par (no exemplo de Bombelli é o que acontece, pois p=−15 e q=−4). Em segundo lugar, pretende-se que q2/4+p3/27 seja da forma −n2, para algum inteiro n>0 (no exemplo de Bombelli, q2/4+p3/27=−112). Também é razoável ter-se q ̸= 0; não há nada de errado, do ponto de vista lógico, em aplicar a fórmula de Cardano com q≠0, mas nesse caso é óbvio que 0 é solução da equação, pelo que este caso não tem interesse. Finalmente, pretende-se que cada um dos números −q/2+ni e −q/2−ni seja da forma (a+bi)3 para dois inteiros a e b (no exemplo de Bombelli, temos 2+i e 2−i). Vamos chamar cúbica de Bombelli a uma equação cúbica que satisfaça todas estas condições.
Há outras cúbicas de Bombelli além do exemplo já visto? Sim, e é muito fácil perceber o motivo. Basta tomar a equação cúbica x3−15x+4=0, pois −4 é solução desta equação e cálculos análogos aos anteriores levam a esta solução, que é então obtida como
3√−2+11i+3√−1−11i=−2+i−2−i
Mais geralmente, se x3+px+q=0 for uma cúbica de Bombelli, x3+px−q=0 também o é.
Há cúbicas de Bombelli diferentes daquelas que já vimos? Sim, há uma infinidade delas e o exemplo de Bombelli nem sequer é o que envolve números mais próximos de 0. Considere-se a equação x3−6x−4=0. Neste caso, q2/4+p3/27=−4. Além disso,
−q2+√q24+p327=2+2i=(−1+i)3
e
−q2−√q24+p327=2−2i=(−1−i)3
pelo que, neste caso, a fórmula de Cardano dá origem à raiz
3√−q2+√q24+p327+3√−q2+√q24+p327=−1+i−1−i=−2
Há uma maneira simples de obter todas as cúbicas de Bombelli. Tomam-se dois inteiros não nulos a e b e considera-se a equação cúbica
x3−3(a2+b2)x−2(a3−3ab2)=0 (4)
É sempre uma cúbica de Bombelli. Com a=2 e b=1, obtém-se aquela que vem no livro de Bombelli e, com a=−1 e b=1, obtém-se x3−6x−4=0. E, naturalmente, podemos criar assim uma infinidade de cúbicas de Bombelli.
Quanto ao motivo de (4) ser uma cúbica de Bombelli, basta ver que, neste caso, p=−3(a2+b2) (que é um inteiro múltiplo de 3) e q=−2(a3−3ab2) (que é um inteiro par). Além disso,
q24+p327=(−a3+3ab2)2−(a2+b2)3=−9a4b2+6a2b4−b6=−(3a2b−b3)2
O termo constante do membro da esquerda de (4) não é 0 pois é igual a −2a(a2−3b3), que não é 0, uma vez que a≠0 e √3 é irracional. Um argumento análogo mostra que 3a2b−b3≠0. Então, neste caso, a fórmula de Cardano afirma que uma raiz da equação (4) é
3√a3−3ab2+(3a2b−b3)i+3√a3−3ab2−(3a2b−b3)i (5)
Mas a3−3ab2±(3a2b−b3)i=(a±bi)3 e, portanto, os números que estão dentro dos radicais de ambas as parcelas da soma (5) são da forma (α+βi)3, com α e β inteiros. De facto, decorre do que foi visto que a raiz que se obtém neste caso é 2a, pois (5) é igual a a+bi+a−bi.
A validade da fórmula de Cardano.
Voltemos à equação cúbica de Bombelli: x3−15x−4=0. Já vimos que 4 é solução desta equação. Será que tem outras? Para determinar isso, podemos dividir x3−15x−4 por x−4; o resultado é x2+4x+1. Então, uma vez que
x3−15x−4=(x−4)(x2+4x+1)
as soluções da equação x2+4x+1=0 também são soluções da cúbica de que partimos. E aquela equação quadrática tem duas soluções: −2±√3.
Uma questão natural a colocar aqui é a seguinte: porque é que a fórmula de Cardano nos dá a solução 4 mas não as outras duas? Acontece que esta pergunta parte de um pressuposto falso; com efeito, ao contrário do que poderá parecer, a fórmula de Cardano dá-nos todas as soluções. A fim de explicar porque é que assim é, é conveniente começar por ver porque é que a fórmula de Cardano é válida. Aquela fórmula é frequentemente apresentada sem qualquer justificação, mas até é simples de provar. Se, na expressão x3+px+q, substituirmos x por u+v, obtemos
u3+3u2v+3uv2+v3+p(u+v)+q
Mas u2v+uv2=uv(u+v) e, portanto, afirmar que a expressão anterior é igual a 0 é o mesmo que afirmar que
u3+v3+q(u+v)(3uv+p)=0 (6)
Para que isto tenha lugar, basta que se tenha u3+v3+q=0 e 3uv+p=0. Mas se for este o caso, então
{u3+v3=−qu3v3=−p3/27
Este sistema de equações resolve-se facilmente. Se, na segunda equação, se substituir v3 por −u3−q, obtemos u3(−u3−q)=−p3/27, o que equivale a afirmar que (u3)2+qu3−p3/27=0. Logo,
u3=−q2+√q24+p327 e v3=−u3−q=−q2−√q24+p327
ou,
u3=−q2−√q24+p327 e v3=−u3−q=−q2+√q24+p327
Em qualquer dos casos,
u+v=3√−q2+√q24+p327+3√−q2−√q24+p327
Está então justificada a fórmula de Cardano. Mas esta fórmula tem um problema, que não tem nada a ver com o sinal da expressão q2/4+p3/27. O problema é o seguinte: cada número complexo diferente de 0 tem três raízes cúbicas. Logo, em geral, a fórmula de Cardano devia dar-nos nove soluções para a equação x3+px+q=0, a qual não pode ter mais do que três. Como é que isto pode ser?
Para compreender o que se está a passar, veja-se que a certa altura, ao deduzir-se a validade da fórmula, se tem 3uv+p=0; no passo seguinte, esta igualdade é substituída por u3v3=−p3/27. E, de facto, as igualdades são equivalentes se estivermos a trabalhar somente com números reais pois, nos reais, dois números são iguais se e só se os seus cubos são iguais. Mas isto não é verdade para os números complexos! Isto decorre do facto já referido segundo o qual cada número complexo diferente de 0 ter três raízes cúbicas. Por exemplo, as raízes cúbicas de 1 são as soluções da equação z3−1=0. Como z3−1=(z−1)(z2+z+1), as soluções daquela equação são, além do número 1, as raízes do polinómio z2+z+1, que são −1/2±√3i/2. Seja ω=−1/2+√3i/2; então ω2=−1/2−√3i/2. Assim sendo, as raízes cúbicas de 1 são 1, ω e ω2. Mais geralmente, se z for uma raiz cúbica de um número complexo ω, então as raízes cúbicas de ω são z, ωz e ω2z.
Decorre daqui que a fórmula de Cardano não deve ser interpretada literalmente; a ideia não é tomar qualquer raiz cúbica de −q/2+√q2/4+p3/27 e somar-lhe qualquer raiz cúbica de −q/2−√q2/4+p3/27. O que há a fazer é tomar uma raiz cúbica u de −q/2+√q2/4+p3/27 e somar-lhe uma raiz cúbica v de −q/2−√q2/4+p3/27 tal que uv=−p/3. E é sempre possível fazer isto, pois se u for uma raiz cúbica de −q/2+√q2/4+p3/27 e v for uma raiz cúbica de −q/2−√q2/4+p3/27, então
(uv)3=u3v3=−p327=(−p3)3
e, portanto, uv é um dos números −p/3, −ωp/3 ou −ω2p/3 e então
- se uv=−p/3, aquele u e aquele v servem;
- se uv=− p/3, basta substituir u por ωu e v por ωv, pois
(ωu)(ωv)=−ω3p3=−p3
- analogamente, se uv=−ω2p/3, basta substituir u por ω2u e v por ω2v.
Antes de prosseguir, convém responder a uma pergunta que provavelmente estará na cabeça de alguns leitores. Porquê toda esta confusão relativa a quais raízes cúbicas levar em conta? Afinal, a fórmula de Cardano já foi empregue repetidamente neste texto e não se teve nenhum cuidado especial com tais escolhas. De facto, e isto assim é por dois motivos. Da primeira vez que a fórmula da Cardano foi empregue, foi para resolver a equação (3). Neste caso, os números −q/2±√q2/4+p3/27 são ambos reais e, naturalmente, tomaram-se as suas raízes cúbicas reais u e v. Mas então uv=−p/3, pois uv é real e, portanto, não se pode ter uv=− p/3 nem uv=−ω2p/3. Em todos os restantes casos, o número −q/2+√q2/4+p3/27 era um número complexo não real e −q/2−√q2/4+p3/27 era o seu conjugado. Mas se a, b, α e β são números reais tais que (α+βi)3=a+bi, então (α+βi)3=a−bi. Então, uma vez escolhida uma raiz cúbica u de −q/2+√q2/4+p3/27, o que é natural fazer (e o que foi feito) foi tomar para v o conjugado de u, o que tem como consequência que uv=uˉu=|u|2, que é um número real. Logo, tal como no caso anterior, uv tem que ser igual a −p/3, uma vez que −p/3 é real. Isto explica porque é que, em todos os casos, o número dado pela fórmula de Cardano foi, de facto, uma solução da equação de que se partiu.
Mas agora convém fazer notar que, dada uma equação cúbica x3+px+q=0, se u e v forem raízes cúbicas de −q/2+√q2/4+p3/27 e de −q/2−√q2/4+p3/27 respetivamente tais que uv=−p/3, então o mesmo acontece com os números ωu e ω2v, bem como com os números ω2u e ωv. Logo, ωu+ω2v e ω2u+ωv também são soluções da equação dada. E isto justifica a afirmação que foi feita atrás segundo a qual a fórmula de Cardano dá todas as soluções da equação, pelo menos no caso da equação x3−15x−4=0. Já vimos que, neste caso, podemos tomar u=2+i e v=2−i. Então a fórmula de Cardano dá, de facto, todas as soluções daquela equação: 4(=u+v), −2−√3(=ωu+ω2v) e −2+√3(=ω2u+ωv).
Isto leva à seguinte questão: será que a fórmula de Cardano permite sempre obter todas as raízes da equação x3+px+q=0? Isto não resulta automaticamente da dedução da validade da fórmula, pois esta dedução envolveu passar pela igualdade (6) e afirmar que, para que seja válida, é suficiente que cada parcela do membro da esquerda seja igual a 0. Mas para que uma soma de dois números seja 0 não é necessário que ambas as parcelas sejam nulas e isto abre a possibilidade de haver outras soluções além das que são dadas pela fórmula de Cardano.
Como vimos, a fórmula de Cardano fornece três soluções da equação dada. Se fornecer três soluções distintas então, visto que se trata de uma equação cúbica, não pode haver mais soluções. Falta então ver o que é que acontece quando as soluções não forem distintas.
Temos então uma equação do tipo x3+px+q=0 e temos dois números u e v tais que u3=−q/2+√q2/4+p3/27, que v3=−q/2+√q2/4+p3/27 e que uv=−p/3. A partir daqui, obtemos os três números u+v, u+ω2v e ω2u+ωv. O que é que acontece se, por exemplo, ωu+ω2v=ω2u+ωv? Temos
ωu+ω2v=ω2u+ωv⇔u+ωv=ωu+v⇔(1−ω)u=(1−ω)v⇔u=v
Mas então as soluções da equação dadas pela fórmula de Cardano são
2u(=u+v) e −u(=ωu+ω2v=ω2u+ωv)
Por outro lado, veja-se que
(x−2u)(x+u)2=x3−3u2x−2u3
=x3−3uv−(u3+v3) (pois u=v)
x3+px+q
de onde decorre que 2u e −u são as únicas soluções da equação dada.
Os restantes casos são análogos: se u+v=ωu+ω2v, então v=ωu e as soluções dadas pela fórmula de Cardano são 2ω2u e −ω2u e, se u+v=ω2u+ωv, então v=ω2u e as soluções dadas pela fórmula de Cardano são 2ωu e −ωu. E mostra-se como atrás que são as únicas soluções da equação. Estes cálculos levam a uma consequência interessante: tem-se
x3+pxpq=0 tem menos que 3 soluções ⇔
⇔v=u ou v=ωu ou v=ω2u
⇔u3=v3
⇔−q2+√q24+p327=−q2−√q24+p327
⇔q24+p327=0
Logo, o número q2/4+p3/27, que é tão proeminente na fórmula de Cardano, é igual a 0 quando e só quando a equação cúbica que se está a resolver tiver menos do que três soluções. E pode-se provar (supondo que p e q são números reais) que é menor do que 0 quando a equação tiver três raízes reais e que é maior do que 0 quando tiver uma raiz real e duas raízes complexas não reais.
Para terminar, observe-se que é desnecessário usar a fórmula de Cardano quando q2/4+p3/27=0. Podemos, é claro, usá-la; obtemos que as raízes são 23√−q/2(=3√−4q) e 3√−q/2. Mas há uma resposta mais simples, que não envolve cálculo de raízes. Caso p=0, então, visto que q2/4+p3/27=0, q=0. Logo, a equação em questão é somente x3=0, cuja única raiz é 0. Caso p≠0, então
q24+p327=0⇔27q24p3=−1
Logo
(3q2p)3=27q38p3=q2⋅27q24p3=−q2
Então uma raiz cúbica de −q/2 é 3q/2p. Aparentemente, pode-se então tomar u=v=3q/2p. Para confirmar que assim é, basta ver se se tem uv=−p/3, mas tem-se isto de facto, pois
uv=(3q2p)2=9q24p2=p3⋅27q24p3=−p3
Logo, as raízes da equação x3+px+q=0 são, neste caso, 3p/q e −3q/2p. Em particular, se p e q forem números racionais, as raízes também são racionais.
Referências
- 1 GINDIKIN, S. G., Tales of Physicists and Mathematicians, Birkhäuser. 1988.
- 2 KATZ, V. J. & PARSHALL, K. H., Taming the unknown: A History of Algebra from Antiquity to Early Twentieth Century, Princeton University Press. 2014.
- 3 LA NAVE, F. & MAZUR, B., Reading Bombelli, The Mathematical Intelligencer, 24, pp. 12–21. 2002.
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