Amieiro Ibérico
Uma espécie-chave das florestas ripárias
📧
- MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente | ARNET – Rede de Investigação Aquática/ U. Coimbra
Referência Ferreira, V., (2024) Amieiro Ibérico, Rev. Ciência Elem., V12(4):039
DOI http://doi.org/10.24927/rce2024.039
Palavras-chave
Resumo
O amieiro ibérico (Alnus lusitanica) é a espécie nativa de amieiro presente em Portugal continental. Esta é uma descoberta recente que resulta do reconhecimento de duas novas espécies de amieiro antes contidas sob a denominação de amieiro-comum (Alnus glutinosa), a espécie que se pensava ocorrer em Portugal. O amieiro ibérico (tetraploide) deriva do amieiro-comum (diploide) por autopoliploidia, e ambos são morfologicamente semelhantes. No entanto, uma vez que em Portugal continental apenas o amieiro ibérico ocorre naturalmente, a identificação de indivíduos na natureza não deverá suscitar dúvidas. O amieiro ibérico distingue-se facilmente das outras espécies da flora nativa com base nas suas características morfológicas. No que respeita às características ecológicas, o amieiro ibérico tem necessidade de humidade constante e por isso ocorre nas margens de rios e ribeiros permanentes, o que faz dele uma espécie ripária. O amieiro ibérico também é uma espécie fixadora de azoto, adaptada a situações de alagamento e de plena luz, o que faz dele uma espécie pioneira. Em resultado das sua características e presença nas florestas ripárias, o amieiro ibérico é uma espécie de grande importância para os rios e ribeiros, contribuindo para definir o ambiente físico, as características da água, as comunidades e os processos aquáticos. Consequentemente, o amieiro ibérico é uma espécie-chave das florestas ripárias. Adicionalmente, o amieiro ibérico fornece um grande número de serviços ecossistémicos às populações humanas. As populações de amieiro estão, no entanto, ameaçadas por vários fatores como a infeção por agentes patogénicos, as alterações climáticas e as atividades humanas. Em resultado da sua importância e fragilidade, devem ser tomadas medidas com vista à proteção dos amiais.
Amieiro: Identidade e distribuição.
Os amieiros (género Alnus, família Betulaceae) compreendem cerca de 35 espécies de árvores e arbustos com flor (angiospérmicas), a maioria distribuída por zonas de clima temperado do hemisfério norte. Até 2017, considerava-se a existência de quatro espécies nativas de amieiro na Europa: o amieiro-comum, amieiro-vulgar ou amieiro-negro (Alnus glutinosa (L.) Gaertn.), o amieiro-cinzento (Alnus incana (L.) Moench), o amieiro-verde (Alnus alnobetula (Ehrh.) K.Koch, também conhecido como Alnus viridis (Chaix.) D.C.) e o amieiro-de-Nápoles (Alnus cordata (Loisel.) Duby). Destas quatro espécies, o amieiro-comum (A. glutinosa) é a que tem a área de distribuição nativa mais ampla, abarcando a Europa, o oeste da Ásia e o norte de África, e até 2017 considerava-se que esta era a espécie nativa de amieiro presente na Península Ibérica1. No entanto, em 2017, por aplicação de vários métodos, percebeu-se que a espécie A. glutinosa compreendia de facto três espécies: A. glutinosa, Alnus rohlenae Vít, Douda & Mandák e Alnus lusitanica Vít, Douda & Mandák2, o que aumentou para seis o número total de espécies nativas de amieiro na Europa (FIGURA 1). As duas últimas são espécies novas para a ciência, estando a espécie A. rohlenae limitada à zona oeste da Península Balcânica e espécie A. lusitanica (amieiro ibérico) limitada à Península Ibérica e Marrocos2 (FIGURA 1). Com esta separação da espécie A. glutinosa em três espécies distintas, resulta que a espécie nativa de amieiro presente em Portugal continental é o amieiro Ibérico enquanto em Espanha existe o amieiro ibérico com uma distribuição ampla e o amieiro-comum com uma distribuição mais próxima aos Pirenéus2, 3 (FIGURA 1). Não há espécies nativas de amieiro nos arquipélagos da Madeira e dos Açores; no entanto, o amieiro está naturalizado no arquipélago dos Açores havendo que confirmar qual das espécies será (A. glutinosa ou A. lusitanica).
As três espécies antes consideradas como A. glutinosa estão intimamente relacionadas e são morfologicamente muito semelhantes, o que explica como só recentemente se tenha descoberto a diferença entre elas. A espécie A. glutinosa é diploide (as suas células somáticas têm dois conjuntos de cromossomas (cada conjunto com x = 14 cromossomas), resultando em 14 pares de cromossomas homólogos, 2n = 2x = 28 cromossomas), enquanto as espécies A. rohlenae e A. lusitanica são tetraploides (as suas células somáticas têm quatro conjuntos de cromossomas, 2n = 4x = 56 cromossomas) e terão derivado a partir da espécie A. glutinosa por autopoliploidia2. Por exemplo, e simplificando, decorrente de problemas na meiose com a não separação dos dois cromossomas de cada par aquando da formação dos gâmetas, em vez de se formarem gâmetas haplóides (com 1n = 1x = 14 cromossomas) poderão ter-se formado gâmetas diploides (com 2n = 2x = 28 cromossomas); durante o processo de fecundação, a junção de dois gâmetas diploides poderá ter originado um zigoto tetraploide (2n = 4x = 56).
Características morfológicas do amieiro.
O amieiro ibérico é uma árvore de porte mediado, com uma taxa de crescimento rápida, principalmente nos primeiros anos. Tem uma longevidade baixa, vivendo no máximo cerca de 100 a 120 anos. Apesar de ser difícil distinguir o amieiro ibérico das espécies próximas2, não há confusão na sua identificação em ambiente natural em Portugal continental visto que será a única espécie nativa de amieiro presente; no entanto, podem ter sido plantados exemplares de amieiro-comum em parques (TABELA 1).
A distinção entre o amieiro ibérico e outras espécies da flora nacional é fácil com base em aspetos morfológicos (TABELA 1 e FIGURA 2).
Características ecológicas do amieiro.
O amieiro ibérico encontra-se em quase todo o território de Portugal continental, sendo menos frequente no sul, em zonas de alta montanha (> 1200 m) e em zonas calcárias devido à escassez de linhas de água permanentes. É uma espécie que depende de humidade constante, colonizando as margens de rios e ribeiros permanentes e locais alagados, encontrando o seu habitat óptimo ao longo do troço médio de rios pouco torrenciais, com águas pobres em nutrientes e solos siliciosos. A sua dependência de humidade permanente e presença nas margens de rios e ribeiros faz dela uma espécie ripária. Para isso contribuem as seguintes adaptações que permitem ao amieiro ibérico (e outras espécies de amieiro) colonizar solos pobres em nutrientes, sujeitos a alagamento, e perturbados (espaços abertos e com solos instáveis):
Espécie fixadora de azoto. O amieiro ibérico tem a capacidade de fixar azoto atmosférico – é uma espécie fixadora de azoto (N). Isto deve-se ao facto de ser uma espécie actinorrízica já que estabelece uma relação simbiótica (i.e., relação vantajosa para os dois organismos envolvidos) com actinobactérias (Frankia alni) em nódulos radiculares. Estas bactérias têm a capacidade de captar o azoto atmosférico (N2, também conhecido como azoto molecular, que é uma forma inerte de azoto) e convertê-lo em amónia (NH3–) por ação de enzimas (nitrogenases) – um processo designado de fixação de azoto (N2 → NH3–). No ambiente acídico (pH < 7) do interior dos nódulos radiculares, a amónia é rapidamente convertida em amónio (NH+), que é uma forma de azoto que a planta pode assimilar. Assim, o amieiro ibérico usa o azoto fixado pelas actinobactérias para a síntese de proteínas, ácidos nucleicos, clorofila e outros compostos azotados, enquanto a bactéria recebe hidratos de carbono (açucares) produzidos pela planta durante a fotossíntese. Em resultado desta simbiose que estabelece com actinobactérias, o amieiro ibérico consegue colonizar solos pobres em azoto onde outras plantas teriam dificuldade em estabelecer-se. O amieiro, ao produzir folhada rica em azoto (que se vai decompor no solo) e ao libertar exsudados radiculares azotados, leva ao aumento das concentrações de azoto no solo. De facto, o ritmo de incorporação de azoto no solo pelo amieiro-comum (espécie muito semelhante ao amieiro ibérico) chega aos 185 kg por hectare por ano4.
Espécie adaptada a situações de alagamento. O amieiro ibérico tem necessidade de humidade constante já que tem uma taxa de transpiração elevada devido à rápida taxa de crescimento e grande área foliar. O amieiro ibérico está particularmente bem adaptado ao alagamento, situação que é frequente nas margens de rios e ribeiros e noutras zonas húmidas. O alagamento leva a um défice de oxigénio no solo (anóxia) porque os espaços intersticiais ficam completamente preenchidos por água, o que resulta na morte da maioria das plantas já que nestas condições as raízes deixam de conseguir respirar (morte celular por anóxia). No entanto, o amieiro ibérico tem numerosos poros (lenticelas) na casca o que facilita as trocas gasosas com a atmosfera, e possui aerênquima (tecido de preenchimento no caule e nas raízes com grande espaços entre as células) que facilita o transporte de oxigénio das partes superiores da planta para as raízes (e de dióxido de carbono no sentido inverso). Também, a extensa rede de raízes laterais superficiais permite a respiração das raízes nas camadas superiores do solo onde há maior disponibilidade de oxigénio quando as camadas mais profundas estão alagadas. Quando o alagamento atinge as camadas superficiais do solo, o amieiro ibérico pode desenvolver raízes adventícias (“aéreas”) a partir do tronco e assim aceder ao oxigénio atmosférico quando a respiração ao nível das raízes está diminuída pelo alagamento.
Espécie de plena luz. O amieiro ibérico necessita de plena luz pelo que se estabelece facilmente em locais sem ensombramento. As condições de luminosidade elevada são necessárias para manter as suas altas taxas fotossintéticas e de crescimento. Em consequência, o amieiro ibérico é intolerante a condições de ensombramento. Isto leva a que, à medida que as árvores crescem e os ramos inferiores começam a ficar ensombrados pelas árvores vizinhas, ocorra uma “poda natural” com a morte dos ramos inferiores, ficando a ramificação limitada à parte superior do tronco (exposta ao sol). Também, despois da floresta (amial) estar estabelecida, a substituição das árvores que vão morrendo é difícil devido ao ensombramento que limita a germinação das sementes e o crescimento das plântulas de amieiro ibérico. Assim, o que começa por ser um amial pode transformar-se progressivamente numa floresta dominada por espécies tolerantes ao ensombramento (por exemplo, carvalho – Quercus robur, faia – Fagus sylvatica, castanheiro – Castanea sativa, freixo – Fraxinus angustifolia).
Espécie pioneira. Em resultado das suas características, o amieiro ibérico é uma espécie pioneira já que é uma das primeiras espécies a estabelecer-se em locais perturbados de onde a vegetação foi removida (por exemplo, em resultado de uma cheia ou de corte). O facto de ser uma espécie de plena luz permite-lhe taxas de crescimento altas o que lhe garante vantagem competitiva em relação a outras espécies de crescimento mais lento. O facto de ser tolerante ao alagamento permite-lhe estabelecer-se em ambientes onde outras espécies não sobrevivem. O facto de ser uma espécie fixadora de azoto permite-lhe estabelecer-se em solos pobres em nutrientes onde outras espécies não conseguem estabelecer-se; a sua presença enriquece o solo em azoto facilitando o futuro estabelecimento de outras espécies. O facto de desenvolver um sistema radicular extenso permite-lhe colonizar locais perturbados (como margens de rios e ribeiros); o seu sistema radicular contribui para estabilizar solos perturbados, permitindo o estabelecimento de outras espécies.
De notar que estas características que tornam as espécies de amieiro importantes nas regiões onde são nativas, também fazem delas espécies potencialmente invasoras fora das suas áreas de distribuição natural. Por exemplo, o amieiro-comum é uma espécie invasora na África do Sul, Austrália, Estados Unidos da América e Canadá5.
Importância do amieiro para os rios e ribeiros.
Em resultado das suas características e da sua posição nas margens de rios e ribeiros, o amieiro Ibérico (assim como outras espécies de amieiro noutras regiões) é uma espécie-chave em muito ambientes ribeirinhos, e contribui grandemente para definir o ambiente físico, as características da água, as comunidades e o funcionamento dos rios e ribeiros (TABELA 2).
Por exemplo, o extenso sistema radicular do amieiro ibérico contribui para estabilizar as margens e definir a forma do canal, enquanto as raízes fornecem habitat, refúgio e áreas de alimentação aos organismos aquáticos. Sendo uma espécie fixadora de azoto, o amieiro aumenta a disponibilidade de azoto no solo e, consequentemente, na água, principalmente quando cobre grandes áreas na bacia hidrográfica como observado no caso de outras espécies de amieiro (Alnus spp.)7, 8.
O amieiro ibérico proporciona sombra no verão, o que limita o crescimento de algas e plantas aquáticas e contribui para manter a água fresca6. Além disso, a copa do amieiro ibérico fornece habitat, refúgio, alimento e áreas de alimentação para muitas espécies terrestres e espécies aquáticas durante a sua fase de vida terrestre.
A folhada do amieiro ibérico é macia, tem uma elevada concentração de azoto e baixa concentração de carbono recalcitrante em comparação com a folhada da maioria das espécies nativas9, o que a torna um recurso alimentar muito palatável para decompositores microbianos e invertebrados detritívoros (invertebrados que se alimentam de detritos vegetais)10. Consequentemente, a folhada do amieiro decompõe-se rapidamente nos rios e ribeiros9, 10. Assim, as folhas que caem no outono são uma importante fonte de energia, carbono e nutrientes para as teias alimentares aquáticas11, e permitem que as primeiras fases larvares de insetos detritívoros tenham um recurso alimentar de alta qualidade. Aumentos na disponibilidade de azoto no solo na presença de amieiro podem também aumentar as concentrações de nutrientes nas folhas de espécies não fixadoras de azoto12.
Serviços ecossistémicos fornecidos pelos amieiros.
Para além da sua importância ecológica (TABELA 2), os amieiros também prestam serviços ecossistémicos às populações humanas13 (TABELA 3). Estes serviços podem ser diretos, como no caso dos serviços de aprovisionamento e culturais que são benefícios tangíveis que as pessoas obtêm dos ecossistemas13 (TABELA 3). Os serviços também podem ser indiretos, como no caso dos serviços de suporte e de regulação que em geral não são usados diretamente pelas pessoas mas que sustentam o fornecimento dos serviços diretos13 (TABELA 3). Todos estes serviços derivam diretamente das características dos amieiros (TABELA 1).
Ameaças às populações de amieiro.
Os amiais enfrentam várias ameaças que colocam em risco o seu futuro. Uma das maiores ameaças à sobrevivência dos amiais na Europa é a doença "declínio do amieiro" que resulta da infeção das árvores pelo oomicete patogénico Phytophthora xalni, que tem como alvo as espécies do género Alnus e já está amplamente distribuído por todo o continente6, inclusive em Portugal15, 16 (FIGURA 3). Este agente patogénico infecta as árvores a partir da raiz ou de lesões na base do tronco e coloniza o floema e, posteriormente, o xilema (vasos condutores de seiva elaborada e de seiva bruta, respectivamente), causando o seu bloqueio e impedindo a circulação dos açucares produzidos durante a fotossíntese entre a parte superior da planta e a raiz e a circulação de água no sentido contrário, respectivamente. Os sintomas da doença manifestam-se de forma homogénea ao nível da copa e incluem diminuição do tamanho das folhas e seu amarelecimento, queda precoce das folhas e morte da copa17, 18. Na base do tronco e nas raízes maiores podem encontrar-se manchas necróticas e exsudações escuras na superfície da casca, e lesões em forma de chama sob a casca17, 18. As árvores jovens morrem em meses ou poucos anos enquanto as árvores adultas podem morrer em dez anos; os invernos muito frios limitam a sobrevivência do agente patogénico e podem permitir alguma recuperação das árvores afectadas. No entanto, estes sintomas podem surgir também em consequência de estresses ambientais como a seca ou da infecção por outros agentes patogénicos, pelo que o diagnóstico da doença deve ser feito por técnicos especializados com recurso a diferentes métodos.
Também as alterações climáticas em curso ameaçam os amiais em Portugal. O aumento da temperatura leva a um maior consumo de água pela vegetação natural e pelas populações humanas (para uso doméstico, rega, turismo), o que diminui a quantidade de água em circulação à superfície e o nível freático. Adicionalmente, a menor precipitação poderá não permitir o reabastecimento dos reservatórios de água subterrânea. Em resultado, os rios permanentes podem tornar-se temporários19, o que limitará a presença de amieiro que necessita de humidade permanente.
Quando os solos são de interesse agrícola, os amiais são geralmente reduzidos a uma estreita faixa ao longo das linhas de água. Também as limpezas das margens das linhas de água que não cumpram as regras de boas práticas20 podem danificar ou eliminar árvores desnecessariamente.
Habitat prioritário.
Devido à sua importância ecológica, as florestas aluviais de Alnus glutinosa e Fraxinus excelsior são consideradas habitat prioritário a nível europeu (habitat 91E0*) e estão por isso abrangidas por legislação que visa promover a sua preservação, como o Decreto-Lei nº 140/99 de 24 de abril21 (Anexo B-1; republicado pelo Decreto-Lei nº 156-A/2013 de 8 de novembro22) que transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva Habitats (92/43/CEE23) relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (notar que às datas da diretiva europeia e da sua transposição para a ordem jurídica nacional, ainda se considerava que a espécie nativa de amieiro presente em Portugal era o amieiro-comum)24.
A preservação dos amiais passa por limitar o risco de infeção pelo oomicete patogénico P. xalni. A utilização de plantas de videiro infetadas é uma das principais vias de dispersão de oomicetes patogénicos do género Phytophthora nas florestas Europeias25, pelo que é crucial garantir a sanidade dos viveiros de origem das plantas usadas para reflorestação de modo a evitar introduzir o agente patogénico na natureza. Também, como a infecção dos amieiros por P. xalni ocorre ao nível da raiz e é beneficiada durante os períodos de alagamento, práticas de gestão que reduzam a duração dos períodos de alagamento (por exemplo, remoção de represas obsoletas) podem ajudar a reduzir o risco de infecção dos amieiros em locais onde o agente patogénico está presente16. Adicionalmente, a plantação de novos amieiros em locais onde se conhece a presença de P. xalni deve ser evitada, por um lado para evitar que morram e resulte infrutífera a tentativa de reflorestação e por outro lado para diminuir o número de hospedeiros disponíveis e assim diminuir a presença do oomicete16.
Outro aspeto importante relacionado com a preservação dos amiais tem a ver com a identidade da espécie de amieiro usada em acções de reflorestação e ajardinamento. Como a espécie de amieiro naturalmente presente em Portugal é o amieiro ibérico, é importante que a mesma espécie seja usada em acções de reflorestação como aquelas realizadas no âmbito de programas de recuperação ou restauro da vegetação ripária. A substituição de amieiro ibérico por amieiro-comum na natureza pode ter consequências ecológicas a vários níveis. As duas espécies de amieiro têm distintas características morfológicas, bioquímicas e fenotípicas26, que se podem traduzir em diferenças na adaptação ao clima mediterrânico, na resistência às alterações globais ou à infecção por agentes patogénicos. Também, a introdução de amieiro- -comum (diploide) junto de amieiro ibérico (tetraploide) pode levar ao surgimento de amieiros triplóides que poderão ser estéreis e incapazes de perpetuar as populações. O risco de hibridação entre as duas espécies de amieiro torna também desaconselhável a utilização de amieiro- -comum, incluindo variedades decorativas como o amieiro-comum Imperialis (Alnus glutinosa “Imperialis”, atrativo pelas suas folhas muito recortadas e porte piramidal aberto) em jardins próximos de populações naturais de amieiro ibérico.
Referências
- 1 SAN-MIGUEL-AYANZ, J. et al., European Atlas of Forest Tree Species, Publication Office of the European Union, Luxembourg, p 200. 2016.
- 2 VÍT, P. et al., Two new polyploid species closely related to Alnus glutinosa in Europe and North Africa – An analysis based on morphometry, karyology, flow cytometry and microsatellites, Taxon, 66, 3, 567–583. 2017.
- 3 MARTÍN, M. A. et al., Distribution, diversity and genetic structure of alders (Alnus lusitanica and A. glutinosa) in Spain, Forest Ecology and Management, 562, 121922. 2024.
- 4 PASCHKE, M. W. et al., Soil nitrogen mineralization in plantations of Juglans nigra interplanted with actinorhizal Elaeagnus umbellata or Alnus glutinosa, Plant and Soil, 118, 33–42. 1989.
- 5 HAYLEY, A., XXX, Ontario Invasive Plant Council, Peterborough, ON. 2013.
- 6 BJELKE, U. et al., Dieback of riparian alder caused by the Phytophthora alni complex: Projected consequences for stream ecosystems, Freshwater Biology, 61, 5, 565–579. 2016.
- 7 COMPTON, J. E. et al., Nitrogen export from forested watersheds in the Oregon Coast Range: The role of N2-fixing red alder, Ecosystems, 6, 773–785. 2003.
- 8 SHAFTEL, R. S. et al., Alder cover drives nitrogen availability in Kenai lowland headwater streams, Alaska, Biogeochemistry, 107, 135– 148. 2012.
- 9 RAMOS, S. M. et al., A comparison of decomposition rates and biological colonization of leaf litter from tropical and temperate origins, Aquatic Ecology, 55, 3, 925–940. 2021.
- 10 GULIS, V. et al., Stimulation of leaf litter decomposition and associated fungi and invertebrates by moderate eutrophication: implications for stream assessment, Freshwater Biology, 51, 9, 1655–1669. 2006.
- 11 POZO, J. et al., Inputs of particulate organic matter to streams with different riparian vegetation, Journal of the North American Benthological Society, 16, 3, 602–611. 1997.
- 12 RHOADES, C. et al., Alder (Alnus crispa) effects on soils in ecosystems of the Agashashok River valley, northwest Alaska, Ecoscience, 8, 1, 89–95. 2001.
- 13 FERREIRA, V., Serviços ecossistémicos, Revista de Ciência Elementar, 12, 1, 5. 2024.
- 14 Associação PATO.
- 15 KANOUN-BOULÉ, M. et al., Phytophthora alni and Phytophthora lacustris associated with common alder decline in Central Portugal, Forest Pathology, 46, 2, 174–176. 2016.
- 16 GOMES MARQUES, I. et al., The ADnet bayesian belief network for alder decline: Integrating empirical data and expert knowledge, Science of the Total Environment, 947, 173619. 2024.
- 17 JUNG, T. et al., Canker and decline diseases caused by soil- and airborne Phytophthora species in forests and woodlands, Persoonia-Molecular Phylogeny and Evolution of Fungi, 40, 1, 182–220. 2018.
- 18 MARÇAIS, B. & HUSSON C., Phytophthora em Alnus spp., 27. 2013.
- 19 FERREIRA, V., Rios temporários, Revista de Ciência Elementar, 12, 2, 23. 2023.
- 20 Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
- 21 Decreto-Lei nº 140/99, de 24 de abril. Diário da República n.º 96/1999, Série I-A de 1999-04-24, 2183–2212. 1999.
- 22 Decreto-Lei nº 156-A/2013, de 8 de novembro, Diário da República n.º 217/2013, 2º Suplemento, 1ª Série de 2013-11-8, 6–26. 2013.
- 23 Diretiva n.º 92/43/CEE, do Conselho, de 21 de maio, Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 1992-7-22, L206/7–L206/50. 1992.
- 24 Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
- 25 JUNG, T. et al., Widespread Phytophthora infestations in European nurseries put forest, semi-natural and horticultural ecosystems at high risk of Phytophthora diseases, Forest Pathology, 46, 2, 134–163. 2016.
- 26 GOMES MARQUES, I. et al., Phenotypic variation and genetic diversity in European Alnus species, Forestry, cpae039. 2024.
Este artigo já foi visualizado 236 vezes.