A Geologia de Portugal e da Ibéria



A Gramática Latina de Manuel Álvares primeiro publicada em Lisboa em 1572 foi usada em toda a Europa e ainda foi reeditada no século XIX em França, Inglaterra e em Espanha. Manuais definitivos não são coisa dos nossos dias, mas há que registar duas iniciativas que vão fixar o estudo e a compreensão da Geologia peninsular por muitos anos, tal é o esforço vertido na sua escrita.

Numa edição da Springer, acaba de sair o livro The Geology of Iberia: A Geodynamic Approach, editado por Cecílio Quesada e José Tomás de Oliveira. As suas mais de 1500 páginas, em 5 volumes e contando com cerca de 70 autores portugueses, apresenta as grandes fases de evolução geodinâmica que afetaram os terrenos que compõem hoje a Península Ibérica. Uma visão integradora da geologia da Ibéria, revista à luz dos trabalhos de investigação mais recentes e numa perspetiva global.

Com objetivos diferentes, Portugal de antes da História de Rui Dias é um marco no ensino da Geologia. O primeiro volume, Da Dinâmica Global aos Processos Geológicos, descreve os processos da geodinâmica interna do planeta para que se compreenda a evolução geológica de Portugal. Os seus diagramas e esquemas (de acesso livre) vão ser ferramentas de estudo de gerações de estudantes. Esperam-se para os próximos meses os volumes seguintes, Dos Mapas Estáticos à Dinâmica da Geologia de Portugal (vol. 2) e Geologia de Portugal no Contexto dos Ciclos Tectónicos (vol. 3).



Alterações climáticas


FIGURA 1. Glaciar Perito Moreno (fotografia: Luís Vítor Duarte).

O Plistocénico representa um intervalo muito recente da história da Terra, situando-se entre os 2,58 milhões de anos e os 11,7 mil anos (Ka). Caracteriza-se por variações climáticas abruptas, contando-se várias fases glaciares e interglaciares. Liderada por Sarah Shackleton da Scripps Institution of Oceanography, acaba de ser publicada na revista Nature Geoscience (DOI: 10.1038/s41561-019-0498-0) uma nova contribuição relativa ao período interglaciar, ocorrido anteriormente à última glaciação, ou seja, entre os 129 e 116 Ka. Suportadas na variabilidade dos gases nobres registados em furos de gelo, são apresentadas novas evidências quanto à temperatura média dos oceanos e ao impacto da expansão térmica na variação do nível do mar. Da investigação, conclui-se que, apesar da temperatura e do nível do mar terem estado logo no início da fase quente em níveis ligeiramente superiores aos da presente era interglaciar, aqueles terão evoluído para valores semelhantes aos atuais.



Patinar sobre gelo!


FIGURA 1. Paisagem de inverno com patinadores. (Hendrick Avercamp, 1608).

Todos temos a experiência de que uma superfície de gelo é muito escorregadia. Esta característica é usada na patinagem sobre gelo onde o patim desliza quase sem atrito. A explicação mais usual é que a pressão do patim sobre o gelo provoca uma fusão local com imediato congelamento da água libertada. Esta explicação falha porque, a temperaturas baixas, seria preciso um peso descomunal para provocar a fusão do gelo.

Um estudo recente (DOI: 10.1021/acs.jpclett.8b01188) mostrou que o baixo atrito apenas se verifica num intervalo estreito de temperaturas, sendo muito elevado para temperaturas mais baixas na região dos -100ºC. Combinando estudos macroscópicos do atrito de deslizamento e simulações (dinâmica molecular) mostraram que o coeficiente de atrito de fricção e a mobilidade microscópica das moléculas superficiais de água à superfície do gelo têm dependências na temperatura muito semelhantes. A energia de ativação estimada é quase igual, sugerindo que o baixo atrito de deslizamento estará relacionado com a mobilidade das moléculas de água à superfície do gelo. Há uma camada superficial de gelo que garante a lubrificação do contacto com o patim deslizante. Isto permite que o gelo tenha o comportamento normal de um sólido quando a muito baixas temperaturas e se torne muito escorregadio a temperaturas mais próximas da temperatura de fusão. Esta alta mobilidade superficial das moléculas de água (no gelo) tem outro efeito relevante, a rápida correção de defeitos cristalinos superficiais. Este efeito pode confirmar-se macroscopicamente fazendo um risco superficial com um instrumento cortante sobre o gelo. Feita a experiência a -10ºC, o risco quase desaparece ao fim de 7 minutos.